O conceito de compras ao vivo, ou o livestream shopping, ainda não está muito difundido por aqui, mas seu crescimento no restante do mundo tem chamado a atenção para o modelo. Estamos falando justamente do que o termo diz: um varejista agenda um evento online ao vivo no qual um anfitrião, muitas vezes uma celebridade ou influenciador, promove produtos ou serviços.
Os apresentadores geram entusiasmo, respondem a perguntas em tempo real e procuram criar um senso de urgência em torno de seus produtos, atualizando os espectadores sobre a rapidez com que estão saindo das prateleiras digitais. Brindes e promoções de curta duração geralmente aumentam a emoção. Esse é um modelo com o qual os consumidores dos Estados Unidos estão habituados na TV.
Por lá, canais como o QVC e o Home Shopping Network (HSN), especializados em compras, são avaliados em US$ 1,6 bilhão. Modelo semelhante foi levado para a internet inicialmente na China, com o Taobao Live do Alibaba, e se expandiu para o resto do mundo durante a pandemia, quando os varejistas tiveram que encontrar maneiras alternativas de se conectar com consumidores.
Desde então, o modelo não parou de crescer. A Coresight Research prevê que o mercado global de compras ao vivo chegará a US$ 512 bilhões este ano, sendo cerca de US$ 50 bilhões somente nos EUA. O fato é que as compras ao vivo oferecem uma série de benefícios, mas é preciso saber que o crescimento contínuo depende da superação de vários obstáculos.
Em busca de uma posição consolidada
Nos últimos anos, vários grandes varejistas decidiram realizar eventos de compras transmitidos ao vivo, incluindo Macy’s, Dick’s Sporting Goods, American Eagle, Nordstrom, JCPenney, Bloomingdale’s, Aldo, Petco e até as redes QVC e HSN. Os gigantes online Amazon e eBay se envolveram, e há uma série de plataformas de comércio ao vivo desenvolvidas por redes sociais, como Facebook Live, TikTok Live e YouTube, além de startups como LIVEBUY.
Por seu lado, de acordo com o New York Times, investidores injetaram mais de US$ 380 milhões em empresas de comércio eletrônico de transmissão ao vivo dos EUA no ano passado, em comparação com US$ 36 milhões em 2020. Apesar de todo envolvimento e investimento, o futuro das compras ao vivo está longe de ser certo, já que alguns provedores de plataformas já desistiram e 78% dos adultos nos EUA dizem que nunca participaram de um evento de compras ao vivo.
Contra isso, especialistas dizem que a tração pós-pandêmica sugere que o modelo ainda pode se tornar um canal valioso. Georganne Bender, influenciadora de varejo e diretora da KIZER & BENDER, disse que as compras ao vivo salvaram seus clientes durante a pandemia e abriram muitas oportunidades lucrativas e duradouras. “A transmissão ao vivo está em toda parte. Nesse ponto, só posso vê-la ficando maior”, escreveu ela em resposta a um relatório da Retail Wire sobre a tendência.
A mudança no perfil dos consumidores
Na verdade, as compras ao vivo estão ganhando força porque oferecem o tipo de interatividade e envolvimento que os compradores jovens e tecnicamente alfabetizados realmente apreciam, dizem os especialistas. Um estudo da Klarna aponta que 60% dos compradores que experimentaram dizem que o modelo melhorou sua experiência de compra online. Há outras vantagens para os varejistas, tais como:
– Alcançar compradores em grande escala – a CNBC relatou a história de Anthony Velez, CEO da Bagricultura, uma pequena empresa que vende bolsas de grife usadas em Nova York. No início deste ano, ele fechou suas lojas físicas, que faturavam cerca de US$ 100 mil por mês, e apostou tudo nas compras ao vivo. Desde então, ele disse que ganha US $ 100 mil por dia. O crescimento, segundo o executivo, veio da capacidade de hospedar eventos ao vivo em várias plataformas, atingindo públicos muito maiores.
– Aumentar as conversões – um dos maiores benefícios do comércio ao vivo está na melhoria das taxas de conversão de varejo. De acordo com um relatório da McKinsey de 2021, as empresas relatam taxas de conversão de quase 30% – até dez vezes mais do que no comércio eletrônico convencional. Talvez por isso o Walmart tenha colaborado com o TalkShopLive em um plano para vender livros, música, maquiagem, utilidades domésticas e outros produtos por meio de um Shoppable Simulcast transmitido ao vivo.
– Alcançar o público mais jovem – como os programas de compras ao vivo tendem a ser realizados em sites e aplicativos preferidos pelos jovens, eles são particularmente úteis para se conectar com esses consumidores. Por exemplo, o Qurate Retail Group, dono da QVC e da HSN, lançou recentemente um aplicativo móvel chamado sune, que é classificado como uma plataforma de compras experiencial para alimentar o “desejo da geração Z por experiências de compras ao vivo e sob demanda mais integradas”.
Há potencial, mas há desafios
Ao mesmo tempo que especialistas apontam o potencial de crescimento, muitos observadores da indústria permanecem céticos sobre o poder de permanência da tendência. Entre os obstáculos de adoção mais comuns que eles citam estão:
– Requisitos de tecnologia – a maioria dos varejistas não pode fazer isso por conta própria. Para atingir o público em massa, é necessário um backbone tecnológico que poucos podem pagar. Estações de TV como QVC/HSN já têm isso. Mas outras plataformas, como o TalkShopLive, são relativamente novas nesse jogo, o que significa que talvez ainda não sejam capazes de fornecer o que os varejistas precisam. Além do mais, outras plataformas como Instagram, Facebook e TikTok supostamente recuaram ou atrasaram suas ofertas de compras ao vivo por vários motivos, limitando as opções de hospedagem – pelo menos por enquanto.
– Concorrência de lojas físicas – há evidências de que os jovens, embora grandes compradores online, também sejam nostálgicos em relação às experiências nas lojas. Assim, como sempre, as marcas devem ver o comércio ao vivo como parte de uma estratégia de distribuição integrada mais ampla para atender os consumidores em seu canal de escolha.
– Restrições de agendamento – uma das fraquezas estruturais das compras ao vivo é o fato de os eventos serem agendados para horários e dias específicos. Se os consumidores não estiverem disponíveis, eles não poderão participar. E os replays de vídeo não funcionam, já que o objetivo é gerar burburinho entre as pessoas que participam do evento ao vivo.
– Falta de consciência e apatia – embora o comércio ao vivo seja extremamente popular na China, onde produziu influenciadores famosos, tem demorado mais para se popularizar nos EUA e em outros países. Alguns teorizam que é porque não foi divulgado o suficiente. Outros sustentam que os americanos simplesmente preferem outros tipos de experiências de compras.
Apesar dos desafios, as compras ao vivo são outro caminho para os varejistas alcançarem os consumidores em um mercado muito concorrido. Cada marca precisará considerar os prós e contras de seus negócios e público-alvo e decidir se vale a pena, ou não, investir no modelo.