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Marketplaces: não construa sua casa em terreno alugado

Por: Jean Makdissi

Experiência de 22 anos no mercado B2B e B2C de vestuário. Founder e CEO da IntimaStore.com e Diretor Executivo do Grupo Cleutex, fundado em 1966. Administrador de Empresas e Mestre em Gestão de Competitividade para o Varejo pela FGV. Dirigente da Associação de Lojistas do Brás e membro do Conselho de Curadoria do E-commerce Brasil.

Seja no mundo físico, seja no mundo online, um comércio depende do número de pessoas que acessa suas ofertas. A isso damos o nome de audiência ou tráfego. Uma loja física, se bem localizada, conta com o fluxo de pessoas que passam por sua porta. Porém, uma loja virtual não dispõe dessa vantagem.

O estabelecimento depende do quanto sua marca é conhecida pelo seu público para que gere um tráfego direto ou  dependerá de uma gama de ferramentas, recursos e estratégias capazes de captar audiência. Justamente por isso, a captação de audiência é o ouro do comércio virtual e quem a detém, ou pode oferecê-la, cobra bem caro por ela.

Pesquisas indicam que existem 930 mil lojas virtuais no Brasil*. Destas, as 50 maiores concentram 66%** de todo faturamento do comércio eletrônico brasileiro. Numa conta simples, chegamos à conclusão de que para as demais 929.950 lojas virtuais sobram 34% do mercado para disputarem entre si.

Ocorre que esta concentração não é somente de faturamento, mas principalmente da tão almejada audiência, do tão desejado tráfego.

Quem concentra audiência, pode vendê-la

O fenômeno marketplace é uma tendência mundial e, há mais de 10 anos, vem se consolidando no e-commerce brasileiro onde os principais varejistas, detentores da grande audiência do comércio eletrônico, e que antes compravam e vendiam de tudo, passaram a acoplar outros vendedores e a cobrar comissão sobre as vendas desses terceiros.

E como é para os grandes varejistas?

Para os grandes varejistas é genial, pois eles passam a contar dentre outras vantagens com:

  • Venda de serviço tecnológico e escalável;
  • Oferta de uma gama muito maior de produtos;
  • Oferta de uma quantidade de estoque muito extensa;
  • Redução de custos operacionais e com estoque;
  • Melhoria do atendimento ao cliente.

Aqui vale ressaltar que se tornar um marketplace é um sonho da maioria das lojas virtuais.

E para os lojistas (ou sellers)?

Há também grandes vantagens:

  • Acesso à audiência do marketplace;
  • Baixíssimo ou quase nulo investimento necessário para adesão;
  • Sem custo fixo,
  • Custo somente quando houver a venda;
  • Sem risco de fraude;
  • Vincular sua marca a de um grande varejista;
  • Uma boa alternativa para lançar-se no e-commerce;
  • Uma alternativa de novos canais de venda.

E para o consumidor (que é quem mais interessa) como ficou?

Pesquisas indicam que os clientes estão muito satisfeitos com a relação com os marketplaces, onde quase 90% dos entrevistados indicam como boa ou ótima a experiência de compra.***

Mas para os lojistas, são só flores?

Para aperfeiçoar esse entendimento eu pergunto: qual o maior ativo do varejo? Sim, é o cliente.

E no caso da relação lojista e marketplace, de quem é o cliente? O cliente é do marketplace, contratualmente e de fato.

Se você vende em marketplace, faça uma pesquisa interna e identifique quantos dos CPFs que compraram por lá, passaram a fazer compras pelo seu canal próprio. O número normalmente é bastante baixo, o que prova o fato de que o cliente é do marketplace e não seu.

Somado a essa desvantagem existem muitas outras como:

  • Perda de relevância no Google: SEO do anúncio do seu canal perde para o anúncio no marketplace;
  • Concorrência ilimitada e desleal;
  • Risco de dependência financeira;
  • Processos judiciais a revelia;
  • Mudanças de regras contratuais unilaterais;
  • Comissão mesmo no insucesso da entrega ou mediante cancelamento da compra.

Sentindo na pele

Há tempos venho evangelizando lojistas de todos os portes a não concentrarem os seus ovos numa cesta só. E a cada dia que passa tomo conhecimento de mais histórias que reafirmam esse entendimento, mas parece que precisamos sofrer na pele para aprender, e ironicamente eu novamente acabo de sofrer um revés com marketplaces.

Novamente, pois já havíamos sofrido quando decidimos começar a vender em marketplaces em 2017. Ocorre que não fizemos uma análise estratégica adequada de quais produtos valiam a pena ou não ingressar no canal e não zelamos em fazer uma mudança na descrição dos mesmos. Ao deixar as mesmas descrições, perdemos considerável audiência em nosso site próprio devido à concorrência com o SEO.

E o último revés foi nessa Black Friday. Baseamos nossas compras nas vendas do ano passado e nos preparamos para a data, mas o marketplace em questão alterou seus departamentos e desmobilizou a gerência que nos atendia sem substituir por outra. Consequência: ficamos sem atendimento comercial e nossas vendas caíram 80% em relação ao ano passado.

Isso afetou fortemente nosso fluxo de caixa e, se não tivéssemos estrutura, certamente poderíamos ter comprometido a saúde financeira e até mesmo a sobrevivência da empresa.

Se o ouro deles é a audiência, o nosso são as nossas informações e produtos

Outro fator importante que deve ser considerado é que o marketplace passa a deter todo o conhecimento relacionado ao fluxo comercial dos seus produtos e, com isso, pode estimular concorrentes a competirem, ou até mesmo passar a operar eles próprios suas categorias. Esse fator é recorrente no gigante dos EUA e por aqui. O último grande marketplace que não operava seus próprios produtos, passou a fazê-lo.

É por isso, e por muitas outras histórias que eu adoto esse sábio provérbio árabe: “Não construa sua casa em terreno alugado”.

Marketplace chegou para ficar

Assim como o Uber chegou, o marketplace também chegou para ficar, e não podemos ser como taxistas que reclamam do avanço tecnológico. Quem determina o que quer é o cliente, e o cliente está muito satisfeito com os marketplaces.

Sendo assim, temos que aprender a usá-los a favor dos nossos negócios, mas evitar dependências. Cabe a nós lojistas focarmos no que é nosso. Foque na sua marca, nos seus canais, na sua identidade, no seu propósito, na sua valorização. Não se iluda com números, venda valor e não preço. E construa sua longevidade numa relação sustentável e de longo prazo com o seu cliente.

* Pesquisa Perfil do E-commerce Brasileiro 07/2019 – Big Data Corp e PayPal Brasil
** Pesquisa 300 Maiores Empresas Varejo Brasileiro 2019 – SBVC
*** Pesquisa Webshoppers Ebit Nielsen

Leia também: Marketplace dá lucro? Especialista ensina a utilizar o formato como acelerador de vendas


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