Logo E-Commerce Brasil

A morte do revendedor no e-commerce

Por: Jean Makdissi

Experiência de 22 anos no mercado B2B e B2C de vestuário. Founder e CEO da IntimaStore.com e Diretor Executivo do Grupo Cleutex, fundado em 1966. Administrador de Empresas e Mestre em Gestão de Competitividade para o Varejo pela FGV. Dirigente da Associação de Lojistas do Brás e membro do Conselho de Curadoria do E-commerce Brasil.

De forma simplificada, o revendedor é aquele que compra da indústria ou do atacado e revende para o consumidor final.

É certamente uma opção conveniente para empreendedores no e-commerce, visto que toda a parte de produção, elaboração e divulgação do produto ficam a cargo da indústria, importadores e ou distribuidores. Cabe ao revendedor a conquista do cliente final. Mas, como fica a situação competitiva do revendedor no atual cenário do e-commerce nacional? É o que busco analisar neste artigo.

Contextualizando o cenário, vemos que, mesmo em meio à crise econômica que assola o Brasil, o e-commerce apresenta sinais vigorosos de crescimento.

Os indicadores são favoráveis se considerarmos que somente 4,3% do varejo nacional é virtual, diante dos 9% nos EUA, 19% na Inglaterra e 23% na China, segundo dados do E-marketer e BTG Pactual de 2017. Baseado nessas referências é de se esperar que o e-commerce no Brasil cresça vigorosamente nos próximos anos, acima do crescimento do varejo tradicional, conquistando cada vez mais market-share, até atingir um patamar acima de dois dígitos de participação no varejo total.

Esse crescimento, no entanto, não se reflete nos resultados das operações on-line, que estão cada vez mais espremidos, mesmo que, ao final, a conquista do lucro seja o maior objetivo de uma empresa. Sem o lucro não há desenvolvimento, melhoria do atendimento, investimento e crescimento para empresa, seus sócios e seus colaboradores.

Normalmente, quando uma indústria/mercado cresce, é gerado um ganho de escala que se reflete na queda dos principais custos, mas isso não aconteceu com o e-commerce. Ao longo dos últimos anos, na medida em que o e-commerce nacional ganhou mercado e se popularizou, os principais custos operacionais cresceram.

A despeito do crescimento do mercado de e-commerce, os custos operacionais cresceram!

Os principais motivos para esse fenômeno ter sido invertido está relacionado à natureza dos principais custos operacionais no e-commerce.

Aquisição de audiência

Sempre gosto de apresentar a equação do faturamento, pois ela explica perfeitamente a principal natureza de custo do e-commerce:

  • Faturamento = Audiência X Taxa de Conversão X Ticket Médio;

Audiência: é o número de pessoas que acessaram uma loja;

Taxa de conversão: é o percentual de pessoas dentre as que acessaram a loja, que realizaram o pagamento com sucesso;

Ticket Médio: é quanto em média os clientes que efetivaram suas compras gastaram na loja.

Essa equação demonstra o quão dependente um negócio é da captação de audiência para a geração de faturamento, e considerando que uma loja virtual, diferente de uma loja física, não tem um trânsito de pessoas em sua calçada, a captação de audiência ou geração de tráfego acaba tendo um impacto fortíssimo nos custos de um e-commerce.

Esse impacto é agravado uma vez que, em caso de aumento da concorrência, os custos da geração de tráfego tendem a se elevar. É o que estamos vivenciando atualmente: uma escalada na relação de custos para captação de audiência e uma queda na taxa de conversão.

Custos operacionais variáveis

Outro fator que contribuiu fortemente para o avanço dos custos no e-commerce foi o fato de que diversas despesas tornaram-se variáveis como alternativa aos custos fixos.

Os custos variáveis são aqueles atrelados a um percentual do faturamento. Quando os custos são fixos, normalmente, o crescimento do faturamento dilui esses custos gerando uma margem de contribuição mais generosa.

O atrelamento do custo operacional a percentuais do faturamento pode ser benéfico no início da operação, pois reduz o investimento inicial, mas produz um efeito problemático após o crescimento do faturamento, visto que não permite uma diluição do custo e consequente ganho de escala.

Além dos tradicionais custos variáveis como os impostos e os custos logísticos, somam-se taxas dos marketplaces, de plataformas de e-commerce, de sistemas de gestão, de diversos serviços de marketing e tantos outros penduricalhos operacionais operados em plataforma SAAS como avaliação, atendimento, leilão de frete, e outros.

A situação é tão dramática que esses serviços foram “carinhosamente” apelidados no mercado de SAAStanás, tamanho é o impacto negativo gerado na última linha do DRE (Demonstrativo de Resultados do Exercício).

Como fica a situação do revendedor diante desse cenário pouco alentador aonde o crescimento dos custos torna cada vez mais difícil a conquista do lucro?

Uma das alternativas na busca de lucro, na qual o aumento da escala não é aliada do negócio e a redução de custos não é mais possível, é o aumento do Mark-up (percentual aplicado sobre o preço de custo para chegar ao preço final). Ocorre que os revendedores estão sofrendo uma série de efeitos que elenco a seguir:

Competição por preços

A internet é um território livre onde a busca pelo menor preço está ao alcance de qualquer internauta. Pesquisa realizada em 2016 pela Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro em parceria com o Instituto Ipsos, apontou que para 82,2% dos brasileiros, o preço é a principal variável na decisão de compra de um produto facilmente comparável.

Ou seja, se estivermos falando de um produto de mesma marca e modelo, a decisão do consumidor pesará sobre o preço em 82,2% das vezes. Esse é um grande fator de inibição na possibilidade de aumento do Mark-up.

Concorrência Desleal

Além da competição por preços, temos no Brasil a presença de um grande mercado negro, no qual a informalidade e a sonegação fiscal tornam a competição desleal.

Certamente, operadores que sonegam impostos, comercializam produtos de origem duvidosa e possuem estruturas informais, conseguem ter um custo operacional bem reduzido e praticar preços bem inferiores à média do mercado, o que pressiona fortemente os preços para baixo.

Indústria e distribuidores vendendo direto ao varejo

A popularização da internet e a indefinição dos rumos do varejo fizeram muitas indústrias lançarem seus próprios canais de distribuição direta ao varejo, grande parte de forma oficial e outras tantas de forma extraoficial, que é o caso de indústrias que abrem empresas revendedoras, ou autorizam distribuidores a fazerem às vezes de canais de atendimento ao varejo.

Esse fenômeno prejudica fortemente o revendedor, visto que a indústria tem o domínio da margem de lucro e pode ser muito mais competitiva no mercado, a ponto inclusive de praticar preços inferiores aos revendedores.

Massificação da oferta através de marketplaces

Outro fator que contribuiu com a vida difícil do revendedor na internet foi a massificação da oferta através de marketplaces. Basta o revendedor lançar uma oferta de sucesso em um marketplace, para que em pouco tempo ele veja o seu buy-box sendo disputado por tantos outros concorrentes, pela indústria ou pelo próprio marketplace. Ou seja, a exclusividade do sucesso é muito efêmera.

A morte do revendedor no E-commerce

A conclusão é que o revendedor encontra-se então numa posição competitiva muito vulnerável. Qualquer empresa que não consiga gerar escala, reduzir seus custos fixos ou ter controle sobre suas margens e preços, encontra-se num beco sem saída, e aqui, eu infelizmente venho a denunciar a morte do revendedor no e-commerce.

É importante frisar que esse fenômeno é mais restrito ao e-commerce, visto que o varejo físico consegue garantir algum tipo de diferenciação que lhe garante alguma vantagem competitiva, especialmente relacionada a uma localização física conveniente, que seja agradável a um determinado público consumidor.

Exclusividade de produto ou do tipo de oferta

A solução? Deixar de ser revendedor ou bolar uma alternativa inovadora de oferta.

Em termos de oferta diferenciada, vimos ao longo dos anos surgirem algumas alternativas interessantes e bem sucedidas como os clubes de compras, as assinaturas e aplicativos de entregas convenientes.

Neste ponto é preciso muita criatividade e inovação para driblar as limitações de um mercado já saturado e cheio de ofertas.

O fato é que a exclusividade de oferta passa a ser um fator determinante na busca pelo diferencial competitivo. Dentre as alternativas devemos considerar:

  • Marca Própria;
  • Produção Própria;
  • Desenvolvimento Exclusivo;
  • Contrato de exclusividade com fornecedores;
  • Importação de produtos exclusivos;
  • Nicho de mercado inexplorado;
  • Serviços diferenciados

Todas essas alternativas conduzem ao fator mais importante na busca pelo diferencial competitivo que é a exclusividade de oferta.

E ter diferencial competitivo é essencial na busca pela lucratividade. O fato é que os caminhos da exclusividade não são tão práticos como os da revenda, e exigem muita criatividade, planejamento, por vezes capital e uma boa dose de assertividade.

Por fim, vemos que são tempos difíceis para o revendedor no e-commerce, mas se alguém disse que seria fácil… estava errado.