Se de um lado o comércio eletrônico se consolida e ganha força, de outro o comércio tradicional vê crescer os desafios para que suas operações sejam mantidas. Não há milagres aqui. Quanto mais cedo varejistas de todos os tamanhos identificarem seus pontos fracos e começarem a corrigi-los, mais rapidamente podem se adaptar aos novos tempos e se manter competitivos no mercado.
Analisando as mudanças de comportamentos dos consumidores nos últimos meses, surgem quatro tendências claras que demandam algumas ações específicas para cada uma delas:
Aceleração do futuro digital
O comércio digital já vinha ganhando espaço, deixando as lojas físicas para trás. Essa tendência se acelerou durante a pandemia na grande maioria das categorias de compras. Com isso, cresceram também as expectativas dos clientes em relação aos níveis de serviço. Diante disso, é recomendável:
- Fortalecer soluções multicanais (e.g. pick-up in store, drive thru) que priorizam a conveniência e alavancam o papel das lojas;
- Endereçar as lacunas para garantir uma excelente experiência ao longo da jornada do consumidor. Aqui, vale destacar que, no segmento de produtos para o lar, por exemplo, aproximadamente 1 a cada 3 pessoas desistem de comprar online e as duas principais razões são alto custo do frete e prazo de entrega;
- Impulsionar a eficiência operacional para viabilizar financeiramente o comércio eletrônico, que hoje muitas vezes ainda traz margens negativas para o negócio como um todo.
Consolidação do mercado
De um lado, varejistas de todos os tamanhos vêm lutando contra a falência e, de outro, o mercado vai se consolidando, abrindo espaço para:
- Explorar oportunidades de fusões e aquisições que permitam ganhar escala, ampliar áreas de atuação e/ou adquirir novas competências;
- Analisar o footprint de lojas com olhar crítico para aquelas que não contribuem financeiramente e/ou não se recuperaram após a reabertura;
- Identificar disponibilidade de pontos atrativos de shopping ou rua — que antes estavam ocupados ou que eram economicamente pouco acessíveis. Para dar uma ideia das oportunidades que podem surgir nesse sentido, a expectativa, segundo a Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE), é que a vacância nos shoppings passe de 4,5% no começo do ano para 15% ao fim de 2020.
A era da deslealdade dos clientes
Com a pandemia, o fechamento de lojas, a ampliação de ofertas de novos canais digitais e a indisponibilidade de estoques, os consumidores passaram a explorar novas alternativas de lojas, canais, marcas e produtos. Os consumidores hoje são menos fiéis, o que não significa que sejam menos importantes ou que se deva desistir de fidelizá-los.
Uma pesquisa global da IPSOS revela que no fim de junho, um percentual elevado dos consumidores tinha trocado de produto, marca ou ambos em diversas categorias de consumo – 34% para detergentes, 39% para cerveja e 42% para produtos de beleza, por exemplo. Interessantemente, entre 13% e 15% pretendem permanecer com o novo produto nessas categorias.
Esses dados e tendências reforçam a necessidade de:
- Criar ou reforçar seus programas de fidelidade. Hoje, os programas de fidelidade não são um fator decisivo nas intenções de compra online do consumidor brasileiro. Fidelidade está entre os três fatores decisivos de compras para apenas 10% dos consumidores;
- Leve as funcionalidades das soluções de CRM para o próximo nível, de maneira que permitam identificar o consumidor como indivíduo único independente do canal, entregando ofertas, sortimento e experiência personalizadas;
- Reforce seus serviços financeiros (e.g. carteiras digitais), que além de ser fonte importante de receita e lucro, trazem benefícios adicionais, como aumento da fidelização e fonte de dados;
- Refine seu sortimento, aproveitando para reforçar as ofertas de marcas exclusivas ou marcas próprias com proposta de valor atrativa. A análise da Kearney indica que 66% dos pesquisados tiveram uma diminuição na renda domiciliar como consequência do Covid-19. Pessoas com renda menor a 15 salários mínimos foram as mais impactadas.
O varejo de cabeça para baixo
Os modelos operacionais estão passando por uma forte disrupção, desde a organização da cadeia de suprimentos até a mão-de-obra utilizada nas lojas. Com a aceleração da adoção do e-commerce, os varejistas foram forçados a improvisar soluções e a fazer ajustes em sua cadeia de valor. Para reagir a isso:
- Reequilibre sua cadeia de suprimentos, os estoques e os fluxos de produto para dar conta das mudanças na demanda do comércio eletrônico e lojas físicas;
- Reforce a colaboração com fornecedores estratégicos, com soluções ganha-ganha ao longo da cadeia, desde a procura de eficiências até inovações em produtos e serviços;
- Implemente modelos de alocação, rotinas, e funções flexíveis para o pessoal de loja alavancando algoritmos inteligentes (e.g. machine learning);
- Aproveite para reorganizar a equipe interna e desenvolver incentivos para criar uma cultura e dinâmica mais ágeis, quebrando os silos tradicionais.
A frase de Winston Churchill “nunca desperdice uma boa crise” pode nos servir de inspiração para esse momento. Se o varejo físico quiser sobreviver, terá que se reinventar, integrando-se ao comércio online e potencializando a experiência do consumidor.