Foi um privilégio participar desta edição da NRF 2022 Retail’s Big Show, uma sensação incrível de que o pior já passou e que um futuro ainda mais desafiador nos aguarda. Não obstante alguns espaços vazios importantes na feira — com diversos expositores tendo cancelado de última hora e, da mesma forma, com alguns slots cancelados —, o congresso foi riquíssimo e levantou pontos importantes sobre o futuro do varejo, irrigados com um networking de primeiro nível que permitiram-me extrair insights valiosos que fico feliz em compartilhar neste artigo.
A frase de impacto: “E-commerce is now Old-Commerce”, me marcou no primeiro dia de congresso. Ela foi trazida por Emma Chiu, diretora de inteligência da Wunderman Thompson, em sua palestra The New World: The Challenges and promises of the Metaverse for retailers.
Essa frase me incomodou e me provocou a analisar e questioná-la.
As discussões do congresso transitaram em cima de 6 grandes centros de discussão:
- Customer centricity e a nova geração de consumidores
- Integração do físico com o online
- Evolução do e-commerce para meios alternativos de comércio, o chamado “alt-commerce”
- Metaverso e como “varejar” com ele
- ESG, comércio com consciência social
- Cenário pós-Covid
1) Customer Centricity e a nova geração de consumidores
Tanto no congresso quanto na feira, foi notável a genuinidade do foco na experiência do consumidor. Como um mantra, a todo momento pudemos observar como o foco está não mais no negócio, ou no produto, ou no canal, e sim no consumidor. Essa evolução é genuína, pois tem sido evidente o sucesso das iniciativas de negócios que têm tido esse zelo.
Kate Ancketill, CEO e Founder da GDR Creative Intelligence, em sua palestra trouxe dados demográficos que apontam que daqui a 8 anos, a nova geração Alfa de até 15 anos de idade e a Geração Z (de 15 a 20 anos) já serão mais de 50% da população mundial e elas possuem uma forma não linear de fazer compras (onde entram fortemente os novos canais digitais para venda).
Em quase todas as palestras e temáticas do evento, o cuidado com a nova geração de consumidores era visível e havia uma abordagem especial.
2) Integração do físico com o online
De forma geral reforçou-se a importância do ponto físico (que pode ser uma loja física ou não) em 3 aspectos estratégicos.
Ponto de experiência – a loja física continua sendo o único ponto de interação 360° com o consumidor. Afinal, a realidade virtual e aumentada ainda não atingiram esse nível de eficiência sensorial. Portanto, as lojas físicas continuam sendo o melhor local para essa interação com os clientes.
Captação de clientes – a eficiência na captação de clientes de uma loja física é notável e não tem data para acabar. Portanto, estar presente em pólos de tráfego e no caminho do cliente reforça a conveniência do atendimento bem como a captação de novos clientes. Muitos negócios nativos digitais passam a encarar as lojas físicas como um custo de marketing.
Reforço logístico – as lojas passam a compor a rede logística das marcas e com isso agilizar a entrega na última milha. Pu seja, elas funcionam como mini centros de distribuição reforçando a experiência omnichannel e a entrega ultra rápida.
3) Do e-commerce para o alt-commerce
Essa análise foi feita baseada nos hábitos de consumo das novas gerações de consumidores, que até 2030 devem representar 50% da força de consumo nos EUA.
Essa nova geração é ávida por experiência. Na verdade, a falta dela os desmotiva. Os tradicionais sites de e-commerce, estáticos e não interativos passam a ter menos importância.
Já as redes sociais, mensagerias, ambientes de games, interações entre o físico e o virtual (ou mesmo websites e aplicativos que tragam uma experiência mais dinâmica e interativa) tendem a dominar o cenário. A essas novas modalidades foi dado o nome de Alternative Commerce ou simplesmente alt-commerce.
4) Metaverso e como “varejar” com ele
O congresso buscou explicar e desmistificar o metaverso, que são ambientes virtuais interativos. Neste caso, tendem (com a evolução da tecnologia) tornar cada vez mais realistas a experiência dos usuários.
Bom reforçar que não há somente um metaverso. Cada empresa ou solução pode criar seu próprio ambiente virtual. E aqui fica claro que, assim como a Internet tradicional, tem o poder quem tem a audiência.
O melhor exemplo de metaverso que temos hoje são os games. Num jogo como o Fortnite, popular entre os jovens, o jogador tem seu avatar e o customiza a seu gosto, comprando roupas, armas e acessórios. Não à toa, o Carrefour investiu pesado, comprando um terreno privilegiado dentro dos campos de batalha e abrindo uma loja no game. Fez isso justamente para aproveitar e evangelizar a audiência do jogo com sua marca e proposta. Cabe ainda ao Carrefour criar uma experiência interessante o suficiente para fazer com que os jogadores queiram entrar na loja e passear lá dentro — ao invés de somente serem obrigados a passar na frente pela imposição comercial do negócio firmado entre Fortnite e Carrefour.
Fica claro que essas experiências virtuais ficarão cada vez mais comuns com a evolução tecnológica.
A Cidade de Seoul, por exemplo, já criou sua versão no metaverso. Possivelmente um dia você receberá um convite para participar de uma reunião, ou de um evento na versão metaverso de Seoul. E, talvez, tenha que pagar sua “passagem” e “visto” para acessá-la. Talvez também você queira comprar uma roupa bacana para participar desse evento e quem sabe prefira um lugar mais privilegiado para, por exemplo, ser visto mais. Esses são exemplos de como o varejo irá funcionar no metaverso.
O domínio nos metaversos é de quem conseguir conferir importância e boa experiência aos usuários e com isso garantir a audiência em seus espaços. E nesses espaços, com certeza os terrenos custarão bastante caro. Brave New World.
5) ESG, comércio com consciência social
As novas gerações demonstram também grande preocupação com a questão social e ambiental. Empresas que, na prática, adotam esses cuidados, estão tendo a preferência do consumidor.
É claro que não basta somente zelar pelos princípios de ESG. Todo o pacote deve ser realizado e o ESG é um dos pontos, mas que deve ser levado em conta para obter a preferência e o respeito dos consumidores.
6) Cenário pós-Covid
Tudo dito acima, na verdade, é o cenário pós-Covid. A aceleração digital causada pela pandemia e percebida no Brasil foi um efeito mundial — claro que os EUA já estavam num processo de digitalização mais avançado que no Brasil —, mas também foi acelerado.
No entanto, o pós-Covid trouxe um cenário perturbador para praticamente todo o mundo, que foi o aumento da inflação e da pobreza. Em sua palestra, Ira Kalish, Chief Global Economist da Deloitte, trouxe um estudo profundo que aponta que a inflação foi um efeito mundial e que deve arrefecer com a normalização da produção e do transporte marítimo. A previsão de Ira é que isso ocorra ainda este ano, no entanto, ele mesmo reforça: nada é certo.
E o que mais?
Recomendo ainda que leiam o artigo publicado pelo E-Commerce Brasil, de autoria do Ângelo Vicente, diretor acadêmico da Escola Superior de E-commerce, que traz uma visão complementar aos tópicos aqui abordados.
Mas afinal, o e-commerce é agora o old-commerce?
Quem brilhantemente solucionou essa questão foi Tiago Baeta, fundador do E-Commerce Brasil e diretor acadêmico da Escola Superior de E-commerce, na mediação de painel que realizou no Harvard Club em New York.
Na verdade, Tiago apontou que omnichannel, alternative commerce e metaverso são tão somente evoluções do e-commerce. Ou seja, é tudo e-commerce, que por sua vez (assim como eu gosto de ressaltar em minhas palestras e aulas) não passa de uma evolução do puro e simples comércio. Ou seja, que desde nossos antepassados mais longínquos, buscam evoluir e achar formas de melhorar e potencializar o atendimento dos seus consumidores. Foi assim com os fenícios — que há 4 mil anos desenvolveram o primeiro alfabeto da humanidade, com o objetivo de melhorar suas relações comerciais — e é assim até hoje, com a evolução do e-commerce.
No fim do dia ganha quem, da melhor forma para os consumidores, resolve suas necessidades e desejos, com o mínimo de fricção, com experiência encantadora e conexão emocional. Portanto, se tem uma coisa que não pode sair de “moda” é o cuidado com a experiência do consumidor e uma genuína determinação das empresas em solucionarem problemas, independente do canal de atendimento.