Grande redes que possuem seu modelo de negócios baseado em franquias possuem um grande dilema ao apostar no e-commerce: como criar um canal online significativo e relevante, que ofereça uma experiência espetacular ao cliente, sem que gere conflito de canal com a rede de lojas físicas dos franqueados?
Nada mais natural que o franqueado, que investiu muitas vezes o patrimônio de sua vida no negócio, faça pressão para a marca não criar um e-commerce. Afinal, existe um medo que sua loja física vire showroom para o cliente, que se acostumou a comprar mais barato e com parcelamento sem juros na internet.
Por outro lado, as marcas não podem dispensar a relevância do e-commerce, um setor que tem crescido dois dígitos há 14 anos, e hoje já representa próximo de 4% de todo o varejo.
E muito mais do que olhar apenas o share da venda online é a importância do digital influenciando a decisão de compra na loja física – é um fenômeno oposto do showrooming, denominado “webrooming”.
Segundo a pesquisa da Business Insider de 2014, nos EUA, 69% dos clientes pesquisados afirmaram que já pesquisaram na internet antes de comprar na loja física (webrooming), enquanto 46% já fizeram o oposto, pesquisaram na loja física e fecharam a compra online (showrooming).
Então, muito mais do que olhar apenas a participação da venda online, as marcas precisam colocar o cliente em primeiro lugar e oferecer uma experiência de atendimento única em qualquer canal, online ou offline, no celular, no computador ou no telefone.
Não há espaços mais entre os muros que separavam os diversos canais das marcas, como ocorria antigamente. Hoje, o cliente não entende por que ele não pode trocar ou devolver em qualquer loja física o produto que ele comprou no site. Ele não quer justificativas para a negativa – para ele, pouco importa se isso acontece pois são franquias, lojas próprias ou lojas licenciadas; acima do canal, está a experiência com a marca.
Sendo assim, a questão não é se a marca vai entrar ou não no e-commerce, e sim como ela irá montar sua estratégia para entrar nesse cana. E, nesse contexto, não dá para as marcas desprezarem a força dos franqueados. Logo, dividir a receita do e-commerce com eles não é uma opção, e sim a única saída.
Algumas marcas como Boticário, Constance, Natura e CVC já estão seguindo esse caminho. Abaixo, listo três modelos possíveis para fundamentar a entrada de uma marca de franquias no e-commerce.
Modelo revenue share
Um modelo interessante é o e-commerce comissionar o franqueado baseado na localização do cliente. Nesse cenário, o franqueado mais “próximo” do cliente ganha uma comissão por aquela venda.
Considerando que no marketing de afiliados é comum que um afiliado receba até 20% de comissão por uma venda, seria absolutamente normal que o franqueado, que às vezes coloca sua loja em um shopping empelo qual aproximadamente cinco mil pessoas passam diariamente, receba também tal comissão.
Embora exija que a franqueadora possua estoque e realize venda diretamente para o consumidor, esse modelo de revenue share é o mais simples de operar – inclusive, a comissão ao franqueado pode ser proveniente da verba de marketing, como aquisição de cliente.
Modelo marketplace
No modelo de marketplace, o e-commerce não possui estoque físico, apenas provê uma tecnologia para conectar os clientes com os franqueados da rede, utilizando algoritmos que usam variáveis de distância para escolher a melhor loja para atender a determinado pedido.
Nesse modelo, a situação se inverte e o lojista paga uma comissão para o marketplace. Essa comissão tem que permitir que o lojista consiga uma margem de contribuição igual ou maior do que a venda do produto na loja física.
A vantagem desse modelo é que como o marketplace não possui estoque, ele ajuda girar o estoque dos franqueados, contribuindo com a melhora no caixa e da saúde financeira de toda a rede, e também pode colocar o time de vendas da franquia no jogo – por exemplo, comissionando as vendedoras que realizarem a venda (separação, emissão de nota e expedição do produto).
Por outro lado, é um modelo muito mais complexo de operar, pois envolve a gestão do estoque de vários franqueados, além de ter que orientá-los sobre o processo de expedição.
Sociedade Anônima com franqueados como acionistas
Outra alternativa para colocar os franqueados para “participar” do negócio online é criar uma empresa de sociedade anônima de capital fechado separada para o e-commerce, e nessa empresa seriam distribuídas ações para todos franqueados.
A operação do negócio seria simplificada, pois não envolveria todos os franqueados diretamente na operação, como no marketplace. Por outro lado, pode haver discussões e diligências relacionadas à participação acionária de cada franqueado na empresa, além de ter toda obrigação acessória de manter uma S/A (como ter que publicar balanços).
Existe outra questão sensível nesse modelo: se os franqueados da rede tiverem seus negócios no regime tributário do simples, eles não poderão ter mais de 10% de participação dessa empresa.
Conclusão
Existem muitos outros modelos, que misturam, por exemplo, marketplace com revenue share (se o franqueado não tiver o produto, a franqueadora vende direto para o cliente, mas paga uma comissão menor para o franqueado). Também existem modelos que funcionam tipo o Uber, em que a venda é disparada para todas as lojas, e a primeira que pega realiza a venda.
Todos têm suas vantagens, desafios e dificuldades. O certo é que irá sair na frente as marcas franqueadoras que conseguirem proporcionar, dentro de um modelo “ganha-ganha” que beneficie tanto franqueadora quanto franqueado, a melhor experiência para o cliente.