Grande empresas chinesas, como Gree, Midea, Hisense e TCL, preparam investidas para o mercado brasiliero de eletrodomésticos e eletroeletrônicos. O alto potencial de consumo no Brasil para itens de linha marrom e branca não passou despercebido pelo continente asiático.
O crescimento das fabricantes chinesas sustenta uma mudança de nacionalidade em empresas líderes no setor. Companhias asiáticas frequentemente apresentam um desenvolvimento constante: em 1990 empresas japonesas se destacaram, mas foram substituídas por organizações sul-coreanas que são líderes em diferentes segmentos do mercado nacional.
A começar por 2020, as empresas chinesas aumentaram sua influência, ganhando força no mercado doméstico.
O atrativo do Brasil
O potencial de demanda, conjuntamente ao grande número de habitantes do país, atrai a atenção das empresas chinesas, explica Carlos Murano da Gree. Por exemplo, menos de 30% das casas do país possuem um aparelho de ar condicionado, adiciona o executivo.
Referente ao número de vendas, o segmento ar condicionado é o único que teve um aumento em relação ao registrado em 2019, antes da pandemia de Covid-19, segundo a GfK. Os produtos vendidos cresceram de 4,3 milhões para 4,6 milhões, resultando em aumento de faturamento de R$ 8 bilhões para R$ 9,8 bilhões.
Apesar disso, Murano acrescenta que há diferentes nichos de produtos não tão explorados no mercado brasileiro, como tanquinhos (lavadoras semiautomáticas), lavadoras com abertura frontal, lava e seca e até mesmo refrigeradores de alto valor, com preço médio de R$ 25 mil.
Segundo o diretor de varejo da GfK no Brasil, Fernando Baialuna, as marcas chinesas são capazes de se desenvolver com maior intensidade em mercados emergentes do que nos países da Europa. Em função de uma capacidade produtiva oriunda da China, os preços dos produtos se tornam mais competitivos, resultando em uma maior atratividade para os consumidores.
“Temos ciclos históricos de marcas predominantes. As marcas japonesas foram uma referência, assim como hoje são as coreanas. Agora, podemos ver um ciclo de marcas asiáticas por um bom tempo”, conclui Baialuna.
Ao longo dos últimos dezoito meses, o mercado brasileiro de eletroeletrônicos despertou um ciclo definido pelo investimento em grandes empresas chinesas, observa o presidente da Eletros, José Jorge do Nascimento que elencou os três maiores fatores que convidam as marcas para o território brasileiro.
Além de contar com um mercado de 200 milhões de potenciais clientes reunidos em um único país, outros dois fatores são considerados como atrativos. Devido ao isolamento social, ocasionado pela pandemia, a movimentação de mercadorias vindas da Ásia precisou ser interrompida, levando as empresas a compreenderem a necessidade de espalharem suas fábricas pelo mundo, evitando um bloqueio do comércio. O último fator, mencionado pelo presidente da Eletros, é a posição estratégica do país, visto que ter uma fábrica no Brasil pode ser uma oportunidade de exportação para a América Latina.
Para empresas já estabelecidas, as investidas chinesas no mercado são entendidas como naturais, as companhias estão acostumadas, afirma o presidente. O grande beneficiário será o consumidor, por conta de uma maior oferta de produtos e preços mais competitivos, uma das principais características das empresas chinesas.
As grandes empresas Sul Coreanas
Grandes marcas da Coreia do Sul, como Samsung e LG, estabelecidas no Brasil em segmentos de televisores, ar condicionado, máquinas de lavar e refrigeradores, já reagem ao crescimento da competição no mercado.
Globalmente, segundo a consultoria Omdia, a Samsung é líder mundial na categoria de televisores há 17 anos. Mario Sousa, líder da divisão de eletrônicos de consumo no Brasil, afirma que a empresa se prepara para entrar em novos nichos de mercado em 2023, lançando fornos, cooktops e coifas. A companhia trouxe, ainda esse ano, a categoria de TVs OLED, antes dominada pela rival LG.
“A concorrência no setor de eletrodomésticos é saudável e demonstra a maturidade do nosso mercado, algo natural em um ambiente em que o consumidor é o maior beneficiado. Entendemos que liderar deve ser mais do que ser o primeiro ou o melhor, mas a consequência de um compromisso constante pela busca da inovação em todos os aspectos de uso dos produtos”, diz o executivo.
O segmento cresceu 21% em receita, no período de janeiro a abril de 2023. A Samsung ampliando sua vantagem competitiva cresceu 5,7 p.p em comparação ao segundo colocado, de acordo com a GfK.
Crescendo seus investimentos a rival LG, apesar de não ter possuir planos para entrar em novas categorias em 2023, a empresa aumenta seus esforços realizando estudos visando nacionalizar a produção de refrigeradores.
Gree Electric Appliances
Com uma história passando pela companhia japonesa Hitachi e pela coreana LG, Carlos Murano, gerente-executivo da Gree Electric Appliances e responsável pela operação da empresa no Brasil, explica que da mesma forma como a provação das coreanas foi de 2000 a 2005, as empresas chinesas atualmente passam por um momento semelhante.
Os produtos da Gree se encontram há mais de 30 anos no mercado brasileiro. Contando com um portfólio diferenciado entre ar condicionado, celulares, refrigeradores e aspiradores de pó, a empresa foi a primeira marca chinesa a se estabelecer no país. Líder no segmento de ar condicionado há dez anos, a empresa tem sua produção localizada em Manaus (AM), segundo Murano.
A única fábrica da empresa fora da China fica no Brasil. Ocupando uma área de 100 mil metros quadrados e empregando cerca de 1.500 pessoas, a fábrica tem a capacidade de produzir um milhão de ar condicionado por ano. Somente em 2022, 600 mil aparelhos foram desenvolvidos. Além disso, a capacidade para acelerar a produção e incluir novos itens existe.
Apesar de não revelar seu faturamento, ou valores investidos no país, a empresa detalha que se prepara para um lançamento, ao final do ano, dentro do setor de ar condicionado. Murano ainda comenta que há estudos em andamento acerca de trazer refrigeradores e lavadoras lava e seca, porém frisa que “É um projeto bem embrionário”. Sem adicionar se seriam produções domésticas ou importadas.
O grupo Midea Carrier
A marca Midea Carrier, empresa chinesa e concorrente, movimentou R$ 600 milhões para construção de uma fábrica de refrigeradores com duas portas ao sul de Minas Gerais, especificamente em Pouso Alegre. Com planos para iniciar seu funcionamento em 2024, a planta de 73 mil metros quadrados possui capacidade de produzir 1,3 milhões de aparelhos ao ano.
De acordo com a consultoria GfK, o setor de refrigeradores apresentou um faturamento de R$ 12 bilhões em 2022 com 3,9 milhões de produtos vendidos em comparação a 2019, com um lucro de R$ 9 bilhões oriundo de 4,1 milhões produtos comercializados.
Felipe Costa, CEO da empresa, compartilha que a meta da organização é, em até quatro anos, estar entre os três principais produtores de refrigeradores do mercado. O investimento na produção local fomenta a competitividade necessária para que a empresa ganhe destaque no segmento, diz o executivo.
Com um faturamento de US$ 53 bilhões e 166 mil funcionários ao redor do mundo, o Grupo Midea chegou ao Brasil em 2011 através de uma joint venture com a americana Carrier, especialista em ar condicionado e refrigeração.
Contando com duas fábricas no país, a produção se divide. Em Manaus (AM) são produzidos os aparelhos de ar condicionado e fornos de micro-ondas; já em Canoas (RS) os sistemas de refrigeração comerciais são confeccionados.
A diretora de marketing da Midea Carrier, Simone de Camargo, enfatiza que mesmo sem uma produção local de eletrodomésticos da linha branca e importando um volume reduzido, fatias significativas do mercado em 2022 foram conquistadas.
“Com a nova fábrica, pretendemos aumentar a participação em refrigeradores de duas portas, que é um segmento de mercado muito importante para a consolidação da marca”, diz de Camargo. A marca respondeu por 25% do mercado de lavadoras com abertura frontal, incluindo lava e seca; 56% em frigobar; 11% em geladeira side-by-side; 27% em freezer horizontal e 13% em lava-louças.
A empresa não pretende produzir localmente todos os produtos, apenas os que representam categorias com grande volume de vendas. Refrigeradores primeiramente e na sequência provavelmente lavadoras com abertura frontal, um mercado potencial muito grande no Brasil, finaliza a diretora.
Hisense
A Hisense, mais uma gigante chinesa, com um faturamento global de US$ 27,5 bilhões em 2022, acaba de chegar ao Brasil. Em março de 2023, iniciaram as vendas de fornos elétricos, lavadoras lava e seca, cooktops, refrigeradores e aparelhos de ar condicionado, importados da Europa e da China, em 38 lojas físicas da Via, no Estado de São Paulo. Com planos para, até o final do ano, produzir localmente TVs com a marca Hisense.
Ademais, a empresa pretende fabricar no Brasil eletrodomésticos da linha branca, porém não revela datas do planejamento, valores de investimento ou projetos para fábricas. “Estamos estudando as possibilidades”, menciona o vice-presidente da Hisense no Brasil, Matjaz Cokan.
TCL Corporation
Adotando uma estratégia diferenciada, a empresa TCL presente no Brasil desde 2016, apostou na nostalgia. Em 2020, a empresa adquiriu 80% da ações da joint venture Semp. Hoje, aliadas, a companhia se encarrega da venda de televisores e a TCL trabalha com a própria marca na categoria.
O mesmo aconteceu com a marca Toshiba nas TVs, a Corporation estabeleceu ainda uma parceria com a Multi, empresa brasileira, para a produção e venda no país.
Por meio de importações, em um primeiro momento, a empresa promoverá refrigeradores e máquinas de lavar. Atualmente, a organização vende TVs, produtos de áudio e aparelhos de ar condicionado, porém até o final do ano o plano é ampliar a variedade de produtos no portfólio.
Nikolas Corbacho, gerente de produtos da Semp TCL, explica que por conta de uma concentração da cadeia produtiva dos eletroeletrônicos na China, as empresas chinesas que conseguem criar e vender produtos são mais competitivas no custo e benefício para o consumidor.
“Não tivemos nenhuma rejeição por ser uma marca entrante no mercado. Quando o consumidor vê que leva mais tecnologia com uma relação de preço melhor do que as marcas estabelecidas, ele vê como algo positivo”, completa Corbacho.
O mercado de televisores comercializou em torno de 10,7 milhões de aparelhos em 2022, superando em duas vezes o setor de lavadoras. Em vendas de televisões o país atingiu R$ 25 bilhões, comparado a R$ 22 bilhões em 2021 e R$ 20 bilhões em 2019. Por conta dos altos valores, grande parte das fabricantes chinesas direcionam iniciativas a este segmento.