A pandemia fez dois anos. Nesse período, nos deparamos com o completo desconhecido e, para além do drama social que enfrentamos, foi um tempo de muitas perguntas, especialmente para o mercado. Havia incertezas sobre os movimentos a curto e longo prazo, dúvidas sobre a capacidade de produção econômica e sobre quando a normalidade voltaria — e se voltaria. De todos os lados vinham cenários de possíveis “novos normais”. Mas, entre todas essas indefinições, havia uma única certeza: estávamos diante de uma ruptura histórica que afetaria o comportamento das pessoas de forma definitiva.
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Tentar entender essas mudanças foi uma preocupação do Google desde o início. E depois de dois anos o que ficou claro é que essas transformações se ancoram em dois fatores que tiveram uma aceleração muito rápida nesse período: a piora do cenário socioeconômico e o aumento da digitalização. Alguns dados e informações ajudam a entender a nova realidade que se impõe.
O cenário socioeconômico
Não é novidade para ninguém o tamanho do impacto da pandemia na economia global. No Brasil, o cenário é de recorde de desemprego e de desigualdade da série histórica. Com o aumento da inflação, os consumidores brasileiros também perderam poder de compra — uma cesta básica hoje custa aproximadamente 60% do salário mínimo.
Mas além dos fatores econômicos, essa é uma crise que gerou grandes impactos sociais e traumas. Segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), entre março de 2020 e julho de 2021, o país teve 675 mil óbitos a mais que o processo demográfico natural, um aumento de 62%. O resultado representa um luto coletivo, com a perda de amigos e familiares e um salto no número de órfãos.
A pandemia também provocou efeitos indiretos, como o aumento da evasão escolar, que dobrou já no final de 2020. Portanto, isso gera consequências a curto, médio e longo prazo. Em um cenário financeiro e social tão complexo, o brasileiro nunca foi tão infeliz e insatisfeito com a própria vida, segundo pesquisa do instituto global Gallup World Poll.
O aumento da competitividade
Há duas consequências imediatas desse contexto. A primeira e mais óbvia é que, ao reduzir a renda de quase metade das pessoas no país, temos um número menor de consumidores financeiramente disponíveis. E isso acontece em uma economia mais madura e penetrada em serviços do que em crises anteriores, com menor poder de crescimento orgânico. O resultado é uma explosão de competitividade: os esforços do mercado se debruçam sobre as mesmas pessoas e, dessa forma, adquirir consumidores se torna cada vez mais caro e difícil.
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Esta é a semente de uma grande mudança de mindset: quando o custo de aquisição encarece, a retenção dos consumidores atuais se torna mais importante. É preciso, portanto, aumentar a frequência de atendimento a clientes atuais se o desejo é que os negócios continuem crescendo. Aline Prado, Data & Insights do Google (que trabalhou nas pesquisas sobre as mudanças de comportamento do período), explica: “Quando fica mais caro e mais difícil ter um novo cliente, começamos a mudar nosso mindset. O nosso principal ativo deixa de ser um portfólio de produtos para ser um portfólio de clientes. Temos que inventar novos negócios para atender os mesmos clientes com maior frequência”.
A crise de confiança
A segunda consequência é que um cenário de insatisfação profunda e massiva costuma ser o gatilho de um processo de ruptura. É como se a inviabilidade da vida pesasse sobre os acordos invisíveis que temos com os principais personagens do sistema de crenças que vivemos, que são as grandes entidades públicas e privadas. Ou seja, os consumidores estão enfrentando dificuldades tão grandes que deixam de acreditar nas entidades existentes. É uma crise de confiança.
Segundo a pesquisa “The Most Trusted Brands”, da Morning Consult, a queda de confiabilidade nas grandes entidades no Brasil, em março de 2021 em relação ao período pré-pandemia, foi de mais de 20 pontos percentuais em quase todos os casos, chegando a 40 pontos negativos em alguns exemplos. É uma fotografia de um sistema que começa a ruir e que, por outro lado, aponta novos valores e âncoras de confiança.
A mesma pesquisa mostrou que pequenos negócios e profissionais, como médicos e professores, ganharam confiança. O elemento humano é colocado em contraponto às instituições e entidades nessa mudança de valores, um processo que se explica no segundo grande motor de mudanças durante a pandemia: a digitalização.
O digital na máquina do tempo: o choque da disrupção
O crescimento do digital foi nítido durante a pandemia: 6 milhões de usuários foram incluídos na internet no Brasil; 4 milhões de lares foram conectados com banda larga; e 22 milhões de brasileiros fizeram uma compra em um e-commerce pela primeira vez. Maurício Martiniano, Head of Business Solutions, Data & Insights do Google, vê esse período como uma transição gigantesca. “A digitalização acelerada funcionou como uma máquina do tempo: empacotou uma evolução esperada para uma década em apenas dois anos. Saltamos de 2019 a 2030. É impossível encontrar o mesmo consumidor pré-pandemia”, diz.
Há também uma mudança importante na maneira como os consumidores se relacionam com as marcas e os produtos. Ganhou-se o poder de ter informações e opiniões reais sobre tudo que se vai comprar e a percepção de valor ficou menos abstrata. As buscas por reviews e críticas de produtos no Google, por exemplo, aumentaram 26% durante a pandemia. E essa procura significa, na verdade, uma conexão com outros consumidores, que se tornam o fiel da balança para dar a real opinião sobre um produto — isso quando não há um criador de conteúdo recomendando o que ele mesmo consome.
As pesquisas por recomendações deixam consumidores e marcas ainda mais intermediados do que antes. E o que se observa é que há uma distância entre os consumidores e marcas que precisa ser corrigida. Quando as figuras humanas ganham confiança e as entidades a perdem, a explicação passa pelo processo de conexão entre pessoas que o digital potencializa.
O condicionamento à possibilidade digital
Durante a pandemia, o tempo foi digitalizado: tudo que se fazia na rua passou a ser feito online. Mais especificamente, passou a ser feito em um aplicativo. De 2019 a 2020, o tempo que o brasileiro gastou em aplicativos aumentou em 1 hora por dia, segundo a App Annie. E hoje a média é de mais de 5 horas diárias em apps, o que faz do Brasil o segundo país do mundo nesse quesito, perdendo só para a Indonésia.
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A análise desse crescimento mostra que a faixa etária em que houve o maior aumento foi de 35 a 44 anos. Aliás, isso se explica pela expansão das bases de apps de serviço, como os de delivery, de fintechs e de transnacionais.
Há dois pontos essenciais sobre esse processo: o primeiro é que negócios digitais viveram uma grande janela de aquisição de usuários durante a pandemia e puderam aumentar de tamanho, adiantando os resultados de conversão que teriam em momentos futuros.
Consumidor digitalizado
Os cinco maiores bancos digitais do país, por exemplo, adquiriram 27 milhões de clientes desde o início da pandemia até abril de 2021. Esse movimento resultou na escassez de consumidores disponíveis no momento, maior competitividade e maior necessidade de diferenciação entre os players no pós-pandemia.
O segundo ponto é que o consumidor se acostumou à experiência que esses aplicativos são capazes de oferecer. Ainda segundo dados do App Annie, uma sessão em aplicativos de serviços dura em média 1 minuto e 50 segundos. São minijornadas de sucesso que resolvem os problemas dos clientes em menos de dois minutos. Trata-se de um condicionamento a resoluções muito eficientes e sem fricção em termos de atendimento.
Velocidade e excelência mudaram o patamar de exigência no período, fazendo surgir a “ultraconveniência”. Buscas por “entregas no mesmo dia” cresceram 73% durante a pandemia, uma realidade que não era tão comum antes. E além do aumento da urgência, a percepção dos direitos dos consumidores também mudou: a procura por “Procon” no Google Search aumentou 42%, e por “como cancelar ou devolver compras” cresceu 62%. Esse conceito que vem dos superapps chineses se instalou primeiro no varejo brasileiro, depois nos serviços, e se transformou em premissa básica de avaliação das empresas cross categorias.
3 regras de ouro na relação com os consumidores
No mundo pós-pandemia, a relação com os consumidores deve se estruturar em um tripé que tem o elemento humano como valor, o digital como ferramenta e a ultraconveniência como modus operandi. Para construir essa base, algumas atitudes são fundamentais:
1. Humanize seu negócio
As relações entre marcas e consumidores estão mais equilibradas do que nunca, por isso é fundamental trazer diálogo, sem ser expositivo. A “humanização” nada mais é do que prestar atenção nas pessoas, se colocar no lugar delas e oferecer o que precisam. Quanto mais peculiares e profundas são as necessidades dos consumidores, mais forte a conexão. Lembre-se que as entidades abstratas estão perdendo força. Entender que as figuras humanas são as novas âncoras de confiança é primordial para perceber como os pontos de contato humano das marcas vão ganhar força e como as corporações que se entendem por “nós” terão que ser “eu”.
2. Tire os obstáculos do caminho
Em um mercado de maior competitividade, ninguém vai escolher quem deixa o caminho cheio de dificuldades. Hoje, ter uma UX ruim é um ralo de clientes. Mais que resolver usabilidades, um primeiro passo é perceber fricções e resolver os problemas das categorias que ninguém resolve.
3. Empodere seu cliente
As relações analógicas daqui para a frente podem significar “dar trabalho”, a não ser que elas sejam um tratamento de alta atenção e luxo. Nos acostumamos a colocar os dados do cartão de crédito em qualquer novo aplicativo porque temos a sensação de transparência e controle. Não é mais a solidez que dá garantia ao consumidor, e sim a ultraconveniência que uma marca ou um serviço pode gerar para o usuário, simplesmente porque entende o que é necessário para ele.
Fonte: Google
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