A indústria de aplicativos e provedores de conteúdo teve uma grande crescente em 2015, por outro lado, também aumentou o número de questionamento destes mecanismos perante o Poder Judiciário no cenário mundial. Por mais simples que possam parecer, ou por mais complexos, ingênuos ou desprovidos de má-intenção, o direito não pode se furtar a sua análise e reflexão, eis que presente questões jurídicas bastante controvertidas. Típicos das novas tecnologias são os novos direitos.
Em verdade, talvez não seja adequado falar em novos direitos, mas sim direitos renovados, reinventados, na mesma linha das tecnologias, que nem sempre criam algo “novo” no sentido estrito da palavra, mas sim, reconstroem o modo de experimentar ou de se realizar alguma atividade.
A partir deste cenário é que o direito deve se debruçar, eis que surge a necessidade de analisar tais mecanismos a partir de um viés jurídico, uma vez que, embora tais tecnologias apenas reinventem o modo de experimentar determinadas situações, surgem implicações jurídicas distintas daquelas até então conhecidas, ou seja, há que se falar em uma readequação do direito também, de modo que acompanhe tais inovações.
A ideia central da análise jurídica, pelo menos a que nos propomos a realizar, serve, em síntese, para introduzir um diálogo e tornar consciente questões que passam despercebidas, e o fim disso é evitar aborrecimento por parte dos desenvolvedores, bem como, do seu usuário final.
O primeiro ponto que entendemos fundamental é no que concerne a legalidade do aplicativo perante o local e em que é proposto, isso se aplica, em regra, aqueles sistemas cuja atuação se dará de modo restritivo. Por outro lado, vale anotar que impera entre os desenvolvedores um pré-requisito importante na propositura de um aplicativo, qual seja a possibilidade de internacionalização, que por sua vez requer uma análise mais aprofundada ante o rigor com que alguns países tratam a internet.
Não temos conhecimento, até então, em nosso país, de algum aplicativo que por si só seja ilegal, até porque somos bastante liberais quanto a isso, mas por outro lado, o que se pode perceber, e isso é de uma claridade solar, é que alguns aplicativos oportunizam, facilitam ou pior, diria: incentivam, construindo um espaço passível de cometimento de atos ilícitos e condutas danosas em maior ou menor grau numa escala de risco.
Para ilustrar e justificar a reflexão proposta, vale a pena apontar, mesmo que em poucas linhas, alguns aplicativos atualmente existentes.
O aplicativo Whatsfake, por exemplo, que permite criar/simular conversas do Whatsapp, ao nosso sentir, apresenta um risco extremo de violação de direito, talvez represente o ápice da escala. Tal aplicativo anda na contramão das boas políticas de uso da internet.
Fato é que a sua função primordial é a violação explícita de direito e muito se aproxima da falsidade ideológica por parte de quem se presta a criar um diálogo passando-se por outra pessoa.
Neste ano, não só o Brasil, mas muitos países, conforme já mencionado, promoveram uma análise mais cautelosa de tais aplicativos. Em nosso país, tal discussão já existe, em especial sobre os provedores de conteúdo, mais notadamente as redes sociais. Nos últimos anos diversos aplicativos foram questionados judicialmente, em especial, pela repercussão, podemos citar o Uber, mas muitos outros, além de questionados, foram proibidos.
Neste passo, um aplicativo que merece a atenção é o Muamber, cuja atividade que se propõe a realizar já foi objeto de análise jurídica. A intenção do aplicativo é basicamente facilitar a importação de produtos através de pessoas que estejam viajando em determinado local, em síntese, intermediação de importação.
A respeito do aplicativo, a advogada Gabriela Frassineli alerta que, embora o aplicativo não seja ilegal, as condutas das pessoas envolvidas na transação podem ser consideradas ilegais, em especial por possível infringência a Legislação Tributária.
Em última análise, afirmamos que o importante ponto a ser percebido é o grau de risco criado por determinados aplicativos, que entre os dois pontuados – Whatsfake e Muamber – é evidente o distanciamento entre ambos no que tange aos riscos de danos e a extensão dos mesmos, porém, em contra partida, mais relevante ainda torna-se a adoção de políticas preventivas – em especial para isentar o desenvolvedor de responsabilidade civil.
Defendemos que, em regra, não há motivos plausíveis para realizar-se controle prévio de aplicativos, exceto por seus distribuidores (ex: Google Play, Apple Store), no entanto, a responsabilidade civil dos desenvolvedores de aplicativos deve ser analisada a partir da natureza, finalidade e grau de riscos a violação de direitos, em especial os direitos da personalidade, sobretudo a imagem, a intimidade, a privacidade, moral e a honra.
No âmbito do judiciário, ao nosso sentir, deve-se ainda analisar a partir de uma perspectiva do risco proveito e risco criado, teorias basilares do direito que consistem basicamente na responsabilidade civil do agente em razão do lucro auferido com determinada atividade passível de danos no seu âmbito, bem como, a responsabilidade em razão de um sistema de risco.
Como já defendemos em outro escritos, e reiteramos novamente, as startups, desenvolvedores e distribuidores de aplicativos devem ter o mínimo de bom senso ao disponibilizá-los, uma vez que, ao criar ou facilitar aos usuários meios de causar danos ou atos ilícitos, muito provável que uma carga de culpa recairá sobre as suas costas, e através de uma responsabilidade solidaria vir a ter que indenizar terceiros prejudicados.
Vale a pena frisar que ao verificar potencial lesividade de uma destas plataformas, medidas devem ser tomadas para minimizar tanto os danos quanto a responsabilidade da desenvolvedora, e a Lei do Marco Civil da Internet já é um avanço muito grande para este ramo da tecnologia e proporciona ao desenvolvedor a possibilidade de “retirar a culpa de suas costas” quando se comporta adequadamente, mas isso é conversa para outra ocasião.
Portanto, faz-se necessário que desenvolvedores adotem políticas adequadas à realidade do atual cenário, de evidente questionamento jurídico de tais plataformas, e que isso tenha especial reflexo nos sistemas que são criados e no controle do uso, assim, permitindo maior segurança.