Quando trabalhamos em projetos de e-Commerce B2B, a gestão de estoque é um item muito relevante. Como todo e-Commerce, seja B2B ou B2C, normalmente estamos falando de pelo menos 2 sistemas. Ou seja, a plataforma de e-commerce que precisa de uma posição de estoque para gerar os pedidos; e o ERP, que é o responsável pela gestão do estoque dos produtos, mas que também recebe pedidos de diversas fontes e canais — neste caso, sejam vendedores logados no próprio ERP, sejam soluções de SFA, EDI ou outro tipo de automação.
E quando trabalhamos com o estoque em vários lugares, temos que falar necessariamente de integração de sistemas e sincronização de posições de estoque disponíveis para venda.
E é aqui que entram 3 requisitos que vão brigar entre si:
Maximizar a venda
Garantir que o estoque esteja disponível para o cliente certo no momento certo, que o cliente acesse o estoque e faça pedidos. Se o e-Commerce B2B tiver um visibilidade do estoque para menos, possivelmente alguns clientes irão achar que seu fornecedor não tem o produto e não vão comprar ele, ou até desistam de um pedido maior. Afinal, algum item importante não estava disponível.
Minimizar pedidos não atendidos
Aqui é o inverso. Ou seja, quando a posição de estoque do portal B2B está maior que o estoque físico, permitindo clientes comprarem produtos que efetivamente não existam mais fisicamente no estoque. E quando isso acontece, é necessário ligar para o cliente, cancelar o pedido, fazer trocas de itens ou colocar parte do pedido em backorder. Aqui também entram conceitos como OTIF e Acuracidade de Estoque.
Custo de integração
Como existem diversas arquiteturas de integração, diferentes soluções geram diferentes custos. E quanto menor for o custo de integrar e de manter a integração operacional, menores os erros de estoque.
Estes 3 requisitos irão SEMPRE brigar entre si. Pela Teoria das Restrições (TOC) você nunca conseguirá ter tudo ideal quando se fala em custos, retorno, margem, etc.
Vamos começar a análise pela integração dos sistemas
Quando falamos em integração de estoque entre sistemas (neste caso geralmente ERP e e-commerce B2B), existe a arquitetura ideal? Claro, existe a melhor arquitetura para CADA tipo de problema e situação. Se você estiver procurando uma solução do tipo one size fits all, sorry, como se diz no call center: Senhor, não vai estar dando para podermos estar te ajudando.
Ter o estoque da plataforma de e-commerce B2B 100% integrado e online é a melhor solução para a venda. Significa ZERO de erros de estoque. Tudo o que tiver no estoque estará disponível para venda e nunca serão vendidos produtos que não estejam no estoque. Porém, de longe é a solução mais complexa e cara. Lembro uma vez que uma consultoria SAP queria implementar esta arquitetura. Em 10 minutos de contas e projeções, convenci eles que a carga de processamento do site em cima do SAP seria maior do que a empresa inteira usando o mesmo SAP. Então, perguntei se eles estavam dispostos a duplicar ou triplicar a infra de servidores.
Isto NÃO significa que não seja possível, viável, ou recomendável. Em alguns casos (e eles existem sim), esta pode ser uma boa solução, onde os custos pagam os benefícios.
Via de regra, a melhor opção é uma integração assíncrona que o diferencial de estoque é integrado do ERP para o e-commerce a cada X intervalo de tempo. Onde este X pode ser 1 vez a dia, 1 vez por hora, a cada 10 ou 5 minutos. Tudo depende da velocidade de mudança do estoque no ERP, da acuracidade do estoque físico, da sua capacidade de consolidar a exportar a informação de estoque, processamento de servidores e rede disponível, dentre outros fatores.
Mas então isso significa necessariamente que o e-commerce B2B irá ter a informação da posição de estoque com alguma defasagem (tanto de entradas quanto de saídas)? E que isso irá gerar problemas, na maior parte das vezes de venda de itens que acabaram de ser vendidos e seu estoque ainda não atualizou? Isso é um problema? Sim e não. Erros de estoque e venda SEMPRE são problemas e vão precisar de gerenciamento. Porém, se o custo para não ter o problema for muito maior que o custo de gerenciar o problema, então a solução em si é que é o problema.
Esta é normalmente o que recomendo sempre, principalmente em operações que estejam em estágio inicial, piloto ou em alavancagem. Faça a solução mais simples possível; assuma um certo nível de risco e vá monitorando os problemas. Enquanto forem poucos e estiverem sob controle, ótimo. Quando começarem a aumentar, reveja as estratégias, seja de estoque, seja de tecnologia, faça pequenos ajustes e continue monitorando e ajustando. O bom e velho PDCA. Agora falemos do outro lado da moeda, a própria gestão do estoque. Existem também diversas estratégias para alocar o estoque disponível para o e-Commerce B2B. Vejamos alguns cenários:
O primeiro é segregar um estoque exclusivo para venda via e-commerce B2B. Em termos de erros de pedido, é a melhor opção, você terá ZERO de erro. Porém qual o custo de manter um estoque segregado, sem uma previsibilidade com extrema acuracidade da venda? E se outros clientes, de outros canais, quiserem aquele produto? Vale a pena não ter erro num canal e perder venda no outro? E do outro lado, se o estoque está segregado, e se um item acabar no estoque para o canal digital e tiver no estoque dos outros canais?
A outra opção, que em geral é a mais indicada, é usar o próprio estoque principal para atender os vários canais. Nesta situação deve-se atentar muito para a concorrência do estoque pela venda nos diversos canais. Uma das formas mais tradicionais de minimizar este problema é usar uma estratégia de estoque de segurança. Pode-se definir um percentual do estoque que vai estar disponível para o e-commerce B2B (ou SFA ou qualquer outro canal de venda assíncrono). Numa visão mais sofisticada, este percentual pode variar em produtos numa curva ABC de giro de estoque, por exemplo. Produtos de alto giro e demanda tem um % de estoque de segurança menor que itens de curva C.
Agora, uma coisa que é muito importante de diferenciar é o impacto de erros de estoque no canal digital B2B. Quando falamos em operações de varejo B2C, erros de estoque são muito mais críticos. Em operações B2B o cenário já é bem diferente. Em várias indústrias, o varejo sabe que regularmente o pedido que ele envia não será atendido 100%. Ele pede 10 caixas do produto A, 20 do B e 30 do C. E o fornecedor fatura 15 do A, 20 do B e 25 do C. Isso é ruim, mas não é um “deal braker“, o varejista, via de regra, não vai deixar de comprar só porque a indústria não entregou exatamente o que ele precisava. Existe até um KPI para isto, o OTIF.
Nestes casos de pedidos que tem erro de estoque, o vendedor que atende o cliente ou o time de Operações de Vendas podem entrar em contato com o cliente para negociar uma alteração no pedido, fazer um atendimento parcial inicialmente e entregar o restante depois, colocar itens para produção ou sugerir produtos alternativos quando a produção for longa, inviável ou em casos de importação. Se você vender iogurte, e tiver 10 sabores de um determinado produto, caso falte um sabor, a chance do cliente varejista aceitar outro sabor no lugar é bastante alta. Se vender vinhos e tiver produtos equivalentes do mesmo tipo e faixa de preço, idem. Agora se você fabricar 1 tipo de cimento e 1 tipo de cal, se não tiver cimento, a chance do varejo aceitar o cal no lugar cai bastante.
Novamente, cada tipo de indústria, produto e relação cliente-fornecedor vai dizer o impacto que uma quebra de estoque terá no atendimento do pedido, que pode passar geralmente por 3 cenários.
- Fornecedor faz os ajustes no pedido de forma unilateral e envia o pedido;
- Vendedor/Backoffice negocia os ajustes;
- Cliente cancela o pedido.
Em vários casos, clientes em que implantamos a solução de e-commerce B2B optaram num primeiro momento por aceitar TODOS os pedidos, mesmo os que eles sabiam que não tinham estoque para atendimento. Parece loucura? Os diretores comerciais diziam algo nesta linha: “Enquanto os problemas não se tornarem insuportáveis, prefiro ter a chance de receber um pedido e poder negociar com meu cliente eventuais alterações de itens, prazo ou desconto, do que nem receber a compra e ter perdido a chance de fazer uma venda. Ou pior, dele ter comprado no concorrente”. Saber quando temos erro de estoque e vendermos produtos que não existem é simples.
Mas e como saber se as decisões de estoque de segurança ou outras estratégias para minimizar erros estão causando perda de vendas? Normalmente você irá conseguir esta informação olhando as reclamações de clientes e vendedores, ligando e perguntando diretamente aos clientes ou fazendo análises de abandono de produto e checkout do site com ferramentas como o Google Analytics.
E em cenários de empresas com o canal digital B2B muito mais maduro, de alta escala, alta automação, baixo tícket e alta pulverização? Aqui, como dizemos na roça, é onde a porca torce o rabo. Este tipo de cenário é muito menos tolerante a erros, porque o custo de gestão de pedidos errados é muito grande. Mas estas são operações que já usam processos muito mais maduros e tecnologias mais complexas e caras que se pagam facilmente.
Resumindo tudo, temos o seguinte:
- Zero Risco de Erro = Perda de Venda ou Alto Custo (estoque ou integração);
- Zero Perda de Venda = Risco de Erro em Pedidos ou Alto Custo (estoque ou integração);
- Baixo Custo = Algum tipo de Risco de Erro de Pedido ou Perda de Venda.
Novamente, eu sou partidário do teste, valide, aprenda e adapte. PRINCIPALMENTE em operações que estejam iniciando. Entenda sua operação, como seu cliente reage, como seu time funciona, seus processos de gestão, de tecnologia e estoque. De início, opte por maximizar a venda, mesmo que alguns pratos caiam. Aprender a equilibrar os pratos certos faz total diferença em operações B2B digitais que crescem mais rápido e geram mais retorno.