O PIX é um sistema de pagamento instantâneo digital proposto pelo Banco Central, com previsão inicial de estar no ar em novembro. Ele irá transformar e modernizar de forma positiva toda a área de meios de pagamentos do Brasil, além de impactar positivamente o crédito ao consumo e no varejo.
O Brasil está prestes a entrar de forma decisiva no estágio em que os meios de pagamentos digitais se tornam relevantes — e, ao que tudo indica, predominantes num futuro próximo.
Exemplo chinês
Das iniciativas iniciais no mercado brasileiro de Apple Pay, Samsung Pay — que, de forma tímida abriram esse mercado —, às mais atuais, como PicPay, PayPal, Google Pay, Mercado Pago e PagSeguro, estamos prestes a vivenciar uma nova realidade. Ela pode nos aproximar do estágio vivido na China, maior mercado de pagamentos digitais do mundo, com participação próxima a 85% de todos os pagamentos feitos no país. Lá o sistema é dominado pelas duas plataformas, Alipay e WeChat Pay. Juntsas, representam 94% de todos os pagamentos digitais e são ligadas aos ecossistemas Alibaba e Tencent.
Além da China, os pagamentos digitais já são muito representativos no sudeste asiático, em países como Tailândia (67%), Vietnã (61%), Indonésia (47%), Cingapura (46%), entre outros.
A proposta desenvolvida e em implantação pelo Banco Central vai concentrar na plataforma PIX todo o processo transacional envolvendo consumidores e todos os agentes de mercado — sob controle e administração da autoridade monetária, deixando espaço mais limitado para quaisquer iniciativas independentes que não usem o PIX.
Momento PIX
Como na China, as autoridades monetárias globais querem evitar meios de pagamentos digitais paralelos e independentes, que fujam ao controle dos Bancos Centrais. Isso é o que se viu no ano passado com a tentativa do Facebook com a proposta de sua moeda digital global Libra. E, mais recentemente aqui no Brasil, com a proposta WhatsApp Pay.
Mas o apelo gerado pela proposta contida no PIX, que mobilizou mais de 980 interessados, vai ter terreno fértil para adoção e expansão no Brasil. Isso por conta da intimidade digital ampliada durante o período da crise da pandemia e pela disposição à experimentação das novas gerações. Sem contar, claro, aos aspectos ligados a potencial contaminação pelo uso de papel moeda e cartões. Vale lembrar também do expressivo aumento da oferta de alternativas que o interesse despertado sinaliza. Tanto que o próprio Banco Central cogita na antecipação do lançamento.
Vamos vivenciar uma profunda transformação, com impactos sensíveis na participação dos diversos meios de pagamentos. Haverá redução do uso dos cartões, principalmente os de débito; redução dos custos transacionais; e simplificação, conveniência e tempo envolvidos nos mais diversos pagamentos. O uso do celular para processar os pagamentos — via QR e com eventual uso da certificação por meio de biometria facial — irá se disseminar de forma marcante, marcando o início de uma nova era. E se engana quem imagina que possamos ficar no mesmo estágio que tivemos com os precursores dos pagamentos digitais de uso mais restrito.
A adoção dessa forma de meio de pagamento deverá trazer consigo uma redução importante nos custos financeiros do varejo, especialmente os de pequeno e médio porte. Também irá acelerar a digitalização e bancarização de milhões de brasileiros que continuam fora do sistema atualmente.
Impactos no crédito
Mas algo ainda tem sido pouco discutido envolvendo a adoção do PIX: sua proposta vertente da possibilidade dos pagamentos programados — que poderá ter forte impacto no mercado do crédito ao consumo. Nessa modalidade será possível programar uma sequência de pagamentos futuros em datas pré-estabelecidas. Ela não deverá estar disponível na fase de lançamento, mas faz parte do programa futuro do PIX.
A incorporação dessa modalidade poderá, eventualmente, substituir os pagamentos sem acréscimo praticados pelo varejo. Ou seja, mais uma “jabuticaba brasileira” nas práticas comerciais do setor quando se compara com o que ocorre no mundo.
Mas poderá também retomar o protagonismo do varejo no crédito ao consumo. Irá torná-lo mais direto, acessível e barato, o que permitiria o mais que desejável aumento da oferta e redução de custos e taxas. E esse é um tema que merece muita reflexão.
PIX e o varejo
Como é sabido, o crédito ao consumo representava (pré-Covid) perto de 30% do PIB do Brasil. Um percentual significativamente baixo quando comparado a economias similares ou mais desenvolvidas — que oscilavam entre 50 e 100% do PIB desses países. Ou até mais, em casos extremos.
Num primeiro momento, mercados financeiro, de tecnologia, fintechs e outros segmentos têm estados muito atentos às transformações que ocorrerão. Mas a transformação será muito mais ampla e abrangente.
A perspectiva dos pagamentos programados no PIX poderia criar um novo mercado para o crédito ao consumo no Brasil, com maior envolvimento do próprio varejo. Isso reduziria custos, facilitando acesso e com simplificação, desintermediação e desconcentração de todo o processo. Ou seja, inegáveis benefícios para o crescimento do consumo, às vendas no comércio, da indústria fornecedora e, em consequência, forte impacto na geração de empregos.
O varejo pode e deve ter papel relevante nesse movimento de disseminação dos pagamentos digitais, atuando junto aos seus clientes e até novos usuários e consumidores. A mudança de atitude a partir do PIX deve vir acompanhada de uma mudança comportamental.
Existirão consumidores que pouco ou nenhum relacionamento tiveram com instituições financeiras — e, talvez o primeiro tenha ocorrido no cadastramento para recebimento do auxílio emergencial. Outros possuem renda a partir de atividades informais. Mas para todos será uma nova realidade. O varejo pode ser o melhor agente de apoio e na disseminação do uso. Ele pode se envolver de forma muito mais amigável do que as instituições financeiras.
Por tudo isso e muito mais, o processo precisa ser conhecido e avaliado em seus impactos mais amplos para o mercado. E as empresas potencialmente envolvidas devem se preparar para a nova e iminente realidade.