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Por que o nível de fraude no e-commerce varia por país?

Por que a fraude no e-commerce ocorre com mais intensidade em alguns países do que em outros? Comerciantes do e-commerce, oficiais da lei e empresas provedoras de soluções antifraude discutem essa questão enquanto procuram novos métodos de manter o mercado virtual seguro para lojistas e compradores legítimos.

Décadas de pesquisa sobre o comportamento de fraudadores e criminosos têm revelado interações entre circunstâncias individuais, instabilidade econômica e normas sociais que levam a um crescimento no nível de fraudes. Os comerciantes que se perguntam por que o risco varia conforme a localização ou quando as fraudes online vão deixar de ser um problema (se isso acontecer um dia) precisam entender o que é o chamado “triângulo da fraude”.

O triângulo da fraude

O triângulo da fraude, desenvolvido pelo criminologista americano Donald Cressey na década de 1950, ainda é um modelo válido para análise de riscos e gerenciamento. Cada vértice do triângulo da fraude representa um dos três fatores que aumentam a chance de comportamento antiético e fraudulento em uma determinada situação: pressão, oportunidade e racionalização.

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A pressão motiva o fraudador a agir em resposta a situações emocionais ou financeiras. Por exemplo, o ladrão pode ter problemas financeiros como dívidas ou um vício de alto custo, ou pode estar enfrentando pressão para apresentar um fluxo constante de renda à sua família ou aos seus cúmplices. É comum também a pressão por status social.

A oportunidade surge onde existe pouco ou nenhum controle de fraude. Fraudadores pensam que podem agir com impunidade porque ninguém monitora suas ações. No caso da fraude no e-commerce, a oportunidade surge na forma de sites com pouca ou nenhuma proteção e fraca execução da lei.

A racionalização ocorre quando um indivíduo ou grupo sente-se desculpado ao cometer fraude. Muitas pessoas preferem não pensar em si mesmas como criminosas, então aplicam um raciocínio a seu comportamento para encaixá-lo de acordo com seus princípios morais. A razão que encontram pode ser que não ganham dinheiro suficiente, que precisam sustentar sua família, ou que a corrupção está tão disseminada que sua ação não importa no quadro geral.

Podemos usar o modelo do triângulo de fraude para comparar países com base em uma “escala de fraude”.

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Para exemplificar, podemos comparar os Estados Unidos com o Brasil, o maior e segundo maior mercados de e-commerce das Américas, para ver como os fatores do triângulo da fraude atuam em cada país.

Pressão

Os Estados Unidos e o Brasil são ambos países capitalistas com economias baseadas em consumo, mas os modos de distribuição de renda são muito diferentes. De acordo com a classificação de dados de países em relação à desigualdade de renda, o Brasil é o terceiro país mais desigual nas Américas, enquanto os Estados Unidos são o nono na mesma escala.

Essa disparidade significa que um brasileiro que ganha um salário mínimo deve trabalhar muito mais para poder comprar um novo smartphone do que um americano ganhando um salário mínimo. Esta é uma forma de pressão econômica, e significa que um fraudador no Brasil ou em outro país com altos níveis de desigualdade de renda tem mais a ganhar financeiramente que um fraudador americano, ao roubar um telefone, por exemplo.

Uma única fraude na internet pode, para um brasileiro, significar passar alguns meses sem a necessidade de um emprego e o mesmo não ocorreria em países com melhor distribuição de renda. Instabilidade e crises econômicas também podem aumentar esse tipo de pressão para as pessoas cometerem fraudes.

Oportunidade

Além da fraude em grande escala, conduzida por grupos de crime organizado, é improvável que a fraude de cartão não presente (CNP), que ocorre essencialmente através do uso de dados de terceiros, seja investigada no Brasil. A falta de recursos para os órgãos de execução da lei é parte do problema: a polícia do país pode investigar apenas 10% dos assaltos violentos no momento, sem contar os crimes eletrônicos não violentos. Em mercados onde faltam os recursos para investigar e processar fraudadores, os mesmos veem oportunidades.

Racionalização

Fraudadores racionalizam que seus crimes têm um motivo que os justifique (como a pressão econômica) ou que o crime é a melhor de suas alternativas. A fraude de cartão não presente é um crime não violento que gera prejuízos para instituições, independente do país em que ocorre. Contudo, fraudadores aparentam ter maior facilidade em racionalizar a fraude CNP em países com maior índice comprovado ou aparente de corrupção institucional.

Para o propósito de nossa comparação, vale a pena lembrar que o Brasil caiu nos índices de anticorrupção no ano passado devido ao escândalo de propina da Petrobrás, entre outros. Cerca de 40% dos membros do Congresso brasileiro são acusados de corrupção, mas poucos destes deverão ser julgados. Em um ambiente assim, a racionalização da fraude contra grandes negócios ou agências governamentais é mais fácil do que em países com um menor índice de corrupção.

Conclusão

Isso não significa que os comerciantes e-commerce devam bloquear transações em nível nacional. Em todo país existem consumidores legítimos cujo consumo pode ajudar o crescimento de um e-commerce, assim como existem grupos de fraudadores que podem arruinar o negócio. Um recente estudo sobre fraudes de cartões não presenciais e sua relação com o CEP americano, por exemplo, revelou que o nível de risco varia muito dentro do país, ilustrando a necessidade de avaliação de risco em um nível muito mais detalhado do que o nacional.

Quaisquer que sejam os métodos usados por fraudadores para cometer fraude de cartão não presente, o modelo comportamental é o mesmo. Criminosos cometem fraudes pois encaram pressões, têm oportunidades e racionalizam seu comportamento. Isso significa que promover mudanças sustentáveis envolveriam investimentos institucionais de políticas econômicas, sociais e outras.

Reduzindo a desigualdade de renda, aumentando a segurança e removendo a corrupção institucional, essas pessoas podem criar um ambiente onde existe menos pressão para o cometimento de fraudes, mais chances de uma punição judicial pelo crime, e menos corrupção para ajudar a racionalização criminal. Há que se reconhecer que não há caminho fácil e nem rápido.

Até que isso seja uma realidade, os comerciantes devem entender como os elementos do triângulo da fraude variam por país e, com o tempo, devem proteger a si mesmos e seus negócios com solução antifraude atualizada e precisa para oferecer uma barreira contra o crime, enquanto permite o comércio virtual válido entre fronteiras.