Apesar de Retail Media ser um termo relativamente novo, a venda de mídia, negociação de trade marketing ou publicidade no varejo são conceitos bem antigos, e extremamente estabelecidos.
Uma negociação por um espaço privilegiado dentro de uma loja, como uma ponta de gôndola ou uma ilha, um banner na frente de caixa ou mesmo uma inserção nos encartes de ofertas são práticas comuns em qualquer varejo de qualquer tamanho.
A grande revolução que vemos hoje com esse novo hype em cima de Retail Media é a possibilidade não só de medir o resultado de forma mais efetiva do que foi vendido/comprado na ação, como também a capacidade de segmentar/personalizar a mensagem de forma cada vez mais granular.
Mensuração e personalização para quem?
Atualmente, entretanto, essa capacidade de mensuração e personalização acaba ficando restrita aos players que têm uma operação digital bem madura, na qual fora construído todo o ferramental para que esse tipo de negociação de mídia mais tecnológica pudesse ser aplicada. Vemos os principais marketplaces do Brasil seguindo os passos da Amazon nos Estados Unidos, e construindo seus produtos ou unidades de negócios de publicidade.
Eu mesmo participei da concepção e crescimento do B2WADS, hoje Americanas Advertising, unidade de Retail Media da Americanas S.A. Nesse caso, usamos como grande proposta de valor uma audiência extremamente qualificada de pessoas que já estavam próximas do final da jornada de compra, além da possibilidade do uso de dados proprietários para segmentação e a integração com a loja física para um impacto on e off nas campanhas.
Isso possibilitou um grande case de vendas de ovos de Páscoa durante a pandemia, mesmo com as lojas fechadas. Conseguimos impactar os consumidores com ações online para que as conversões fossem direcionadas para as lojas mais próximas daquele cliente, criando o conceito da única Páscoa omnichannel do mundo.
Entretanto, toda essa capacidade acabou ficando restrita ao canal digital, mesmo as vendas saindo das lojas, já que ainda não era possível impactar o usuário onde quer que ele estivesse, e medir o impacto disso nas vendas on e offline.
É o fim da era cookie?
Mas como saber se um consumidor que viu um post patrocinado no Instagram comprou um produto na loja por causa dessa ação? Como identificar que o resultado de aumento de vendas online teve relação com um OOH (mídia Out of Home ou publicidade exterior em português – refere-se às publicidades genéricas veiculadas em ambiente urbano) num ponto de ônibus perto da casa do consumidor ou mesmo no elevador?
Toda essa dificuldade em mensurar resultados vem dos desafios tecnológicos de cada negócio, que passam pela falta de mão de obra qualificada, e vão até mesmo à não existência de ferramentas que consigam fazer esse papel de forma mais agnóstica e que não fiquem restritas a um único canal. E é nesse ponto que o fim do cookie de terceiros entra como um problema a curto prazo, mas é uma oportunidade fenomenal a médio e longo prazo.
Apenas para dar um contexto, o cookie é uma tecnologia, uma funcionalidade dos navegadores, que armazena uma informação no lado do consumidor de forma que seja possível fazer seu rastreamento pela internet. Com isso, é possível, além de medir de forma efetiva qualquer campanha online, entender o comportamento de navegação do consumidor, e assim entregar uma experiência personalizada para cada um.
É assim que Google, Facebook (Meta) e as principais redes de remarketing constroem seus produtos de retargeting (remarketing), e montam modelos de maximização de conversão de suas campanhas. Quem aqui já não colocou um produto no carrinho, abandonou e foi perseguido na internet pelo mesmo produto ou similares?
A grande questão disso sempre foi a segurança dos dados e a privacidade, pois esses canais conhecem mais do seu consumidor do que o próprio varejo, ou às vezes até melhor que o próprio consumidor. E a partir disso iniciou-se uma discussão enorme até onde essa invasão deveria ir, qual seria a fronteira.
Dada toda essa discussão, a Apple foi a primeira a restringir o tracking dos usuários nos apps que rodam no iOS e a implementar a restrição de cookies terceiros nos sites pelo Safari, impedindo que se tenha um perfil mais amplo de cada usuário. Após isso, o Google anunciou o fim dos cookies terceiros no Chrome, ainda sem data definida para isso acontecer, criando uma grande apreensão em todos que usam esses dados para otimização de segmentação e para conversão.
Problema ou oportunidade?
Mas ok, até agora muito conceito e nenhuma relação entre o problema e a oportunidade. Onde o fim do cookie terceiro pode ser um problema e uma oportunidade para o Retail Media?
Hoje, as ferramentas de mensuração e otimização utilizam esses cookies para que possamos ter uma ideia de como as campanhas estão performando, além de serem as principais fontes de segmentação e audiência. A curto prazo, o fim do cookie terceiro pode significar um certo apagão ou mesmo discrepância nas informações de resultado das ações.
Porém, a utilização de dados proprietários, os famosos first-party data, tanto para mensuração de resultados quanto para construção de audiência qualificada, traz uma oportunidade única para o varejo que souber usar isso a seu favor.
Em vez de usar o dado de navegação em alguma propriedade digital, como app e site, para montar o perfil de compra do usuário, podemos utilizar todas as transações anteriores do consumidor para montar audiências que possam ser usadas nessas campanhas de Retail Media.
Imagine o quão legal seria a indústria poder impactar o consumidor em qualquer canal, usando dados do varejista, sabendo que aquele usuário tem interesse no produto da indústria, e levando a conversão para o varejista que disponibilizou o dado. E ainda assim conseguir saber se aquela mídia digital gerou venda na loja física.
Em um exemplo prático, uma ação feita pela Heinz no Supermercado Zona Sul, no Rio de Janeiro, tinha a proposta de aumentar o cross-sell de sua maionese com seu produto top de venda, o ketchup, sabendo que a maionese concorrente era o item mais vendido junto depois de sua mostarda. Uma ação orquestrada usando dados proprietários do supermercado, e seus canais de comunicação direta com seus consumidores, principalmente o WhatsApp, possibilitou um aumento de mais de 70,3% de itens vendidos de maionese na rede como um todo, isto é, site WhastApp e loja física. A ação também acabou gerando um aumento de market share de 5%. Além disso tudo, um percentual significativo de consumidores mudou sua preferência e passou a comprar maionese Heinz nos meses consecutivos à ação.
Tudo isso só foi possível graças à tecnologia empregada, à centralização dos dados dos canais, à visão unificada do consumidor e, sobretudo, à colaboração e ao compartilhamento de dados e informação entre varejo e indústria, fechando assim o ciclo completo de ativação e mensuração, o que chamamos de closed-loop.
Essa colaboração e esse compartilhamento são essenciais para que tenhamos sucesso nesse novo modelo de mídia, nesse novo mundo em que a privacidade vem primeiro, tendo o consumidor cansado de ser importunado por publicidade que não tem valor para ele. A barra está cada vez mais alta, e o consumidor espera, além de uma entrega mais rápida, uma experiência de compra cada vez mais personalizada e menos invasiva.