Você conhece a gigante do comércio eletrônico chinês Pinduoduo e sua irmã mais nova, a Temu? Pois bem, ambas possuem um histórico singular de sucesso na China e estão expandindo globalmente de maneira bem agressiva.
Iniciando suas operações como Pinduoduo, a empresa acaba de mudar sua marca para PDD Holdings, controladora desses dois sites, e recentemente transferiu sua sede da China para a Irlanda, reforçando um impulso internacional dos gigantes chineses de tecnologia. Listada nos EUA, ela apontou Dublin, capital irlandesa, “como um de seus principais escritórios executivos”. Em um registro recente na Comissão de Valores Mobiliários, já havia listado Xangai como seu escritório principal.
Fundada em 2015 por Colin Huang, a empresa inicialmente operava como um varejista online agrícola, mas depois fez a transição para um modelo de plataforma de terceiros que conecta comerciantes e consumidores em várias categorias de produtos.
Colin Huang identificou uma necessidade de mercado impressionante. Apesar de mais de um bilhão de pessoas serem ativas no WeChat (o equivalente chinês do WhatsApp), apenas 500 milhões delas compravam online. Existia uma enorme massa de pessoas digitalizadas, que usavam seus smartphones diariamente, mas não faziam compras nos canais digitais. Essas pessoas viviam em cidades menores da China, distantes dos centros urbanos, com menor renda per capita e densidade demográfica. A Pinduoduo focou exatamente nesse grupo de consumidores.
O nome Pinduoduo vem de “pin” (juntos) e “duo” (muito), numa tradução livre algo parecido com “unindo muitas pessoas”. Em linhas gerais, é uma plataforma que permite que seus usuários comprem em conjunto para obter benefícios e descontos extremamente agressivos.
Volume, escala, frequência e C2M
Para tornar essa solução viável e atingir esses potenciais compradores com preços verdadeiramente competitivos, a empresa precisou criar volume, escala e frequência. Assim, eles desenvolveram uma plataforma em torno das compras em grupo.
A empresa foi uma das pioneiras em massificar o conceito do C2M (consumer to manufacturer – do consumidor ao fabricante), num modelo de negócio desenhado para não haver intermediários na cadeia de valor, nem varejistas e, muitas vezes, nem as marcas de produtos. Ao comprar um brócolis na plataforma, o usuário compra diretamente do agricultor e, ao comprar uma caixa de lenços de papel (aliás, um dos itens mais vendidos na plataforma), o usuário pode comprar um item de uma marca famosa ou diretamente da fábrica que produz esse item para marcas próprias, por exemplo.
Em 2019, investiram no desenvolvimento de um sistema logístico com foco na agricultura que utiliza algoritmos para otimizar as rotas de transporte. Esse sistema logístico foi a base para o lançamento de um serviço de entrega de supermercado no dia seguinte, o Duo Duo Grocery, em agosto de 2020. O serviço foi criado em resposta às mudanças no comportamento do consumidor durante a pandemia de Covid-19. A Pinduoduo também trabalhou com comunidades rurais para comercializar produtos que não eram vendidos diretamente aos consumidores depois que os mercados atacadistas tradicionais fecharam devido ao surto.
Em apenas cinco anos de existência, a empresa ultrapassou o Alibaba de Jack Ma em número de usuários ativos, com incríveis 789 milhões de pessoas comprando na plataforma em 12 meses, contra 779 milhões do Alibaba nessa mesma métrica.
Seu GMV (gross merchandise value – volume de vendas dentro da plataforma) saiu do zero em 2015 para impressionantes US$ 255 bilhões em 2020 (+66% YOY), deixando um faturamento para a empresa de US$ 9,1 bilhões (+97% YOY), e fazendo o valor de mercado da empresa, que é negociada na Nasdaq desde 2018, alcançar o patamar de US$ 165 bilhões em abril de 2021, ultrapassando a poderosa JD.com.
Temu
Em setembro de 2022, a empresa irmã da Pinduoduo, a Temu, foi lançada nos EUA pela PDD Holdings com um chamativo slogan “Shopping like a Billionaire” e, em questão de semanas, já se tornou um dos aplicativos mais baixados nos Estados Unidos.
Nesta mesma época do ano passado, quase ninguém nos Estados Unidos sabia o que era a Temu. Hoje, enquanto os consumidores norte-americanos lutam contra a alta da inflação, o aplicativo de compras chinês está superando a rival Shein (guardem essa informação).
– Vendas 20% maiores do que a Shein em maio.
– Ultrapassou o tráfego web e a retenção de clientes da Shein.
– Nunca ficou abaixo da terceira posição na Apple Store em 2023.
Ok, mas o que o lar do nosso querido St. Patrick tem a ver com isso?
Bem, a Irlanda se tornou um local popular para empresas estrangeiras de tecnologia se estabelecerem devido à sua adesão à União Europeia e à baixa taxa de imposto sobre as sociedades, que é de apenas 12,5%. Grandes empresas como a Meta e a Apple já têm suas sedes europeias na Irlanda. Agora, a PDD Holdings também escolheu esse país como parte de sua estratégia internacional.
A empresa está localizada em um prédio de escritórios em Stephen’s Green, enquanto a Temu estabeleceu sua sede em Boston, e a Pinduoduo continua em Xangai. Essa mudança para a Irlanda reflete um esforço para distanciar a Temu da China, onde a maioria de suas operações está concentrada, à medida que os Estados Unidos e outros países intensificam a análise e o escrutínio dos aplicativos chineses. As autoridades americanas temem possíveis riscos à segurança de dados, alegando que esses aplicativos podem fornecer informações ou dados pessoais a adversários estrangeiros. Essa preocupação chegou ao ponto de a Alphabet, empresa controladora do Google, suspender o Pinduoduo de sua loja de aplicativos em 2021, citando preocupações com malwares.
A mudança da sede da PDD Holdings para a Irlanda é uma jogada estratégica que visa construir uma presença mais forte e confiável no cenário internacional, ao mesmo tempo em que a empresa se adapta às mudanças regulatórias e políticas em curso.
Todo esse pano de fundo pode estar relacionado também à proteção econômica dos Estados Unidos. Os EUA e a China estão em uma disputa por influência mundial que não se limita ao comércio e à tecnologia (como produção de chips), abrangendo áreas como política, economia e defesa.
Mas nosso assunto aqui é sempre varejo. Lembra que falei para você guardar a informação sobre a Temu já ter ultrapassado a Shein em território americano?
Pois é, todos estamos vendo o que o furacão Shein está causando por estas terras tupiniquins, e a novidade é que a PDD Holdings já tem planos para o mercado brasileiro, de olho no sucesso dessas empresas por aqui. Ou seja, veremos nos próximos meses mais um gigante asiático colocando as mãos nesta panela maravilhosa chamada Brasil.
Na minha opinião, essa onda asiática não vai simplesmente passar por nós. Ela já está aqui na nossa praia e veio para ficar. É verdade que muitas questões ainda precisam ser discutidas, como impostos e proteção de mercado, entre outras. Todas essas discussões são totalmente válidas e fundamentadas, mas de alguma forma precisamos encontrar meios de surfar essa tendência ou correremos o risco de tomarmos o maior “caldo” da história recente do varejo.
E o que você acha disso tudo? Os players nacionais não devem se preocupar ou já é hora de parar, olhar e estudar com muita atenção esse movimento?