A pandemia da Covid-19 mudou o mundo, mudou as pessoas. A moda, como um reflexo do comportamento humano mudará junto com eles.
A quarentena imposta por muitos países aos seus cidadãos descortinaram inúmeras facetas. Uma delas é a de que, com a diminuição da atividade humana, mares, rios, lagos, ares e florestas estão mais limpos. Alguns, inclusive, dizem notar o fundo do mar que permeia Veneza e a floresta da Tijuca, situada no Rio de Janeiro. Eles percebem seus habitantes menos amedrontados, desfrutando do espaço antes dominado por seres humanos.
Não é de hoje que o mercado do consumo tem de se adaptar às novas gerações consumidoras. Com a ascendência da “Geração Z”, formada por jovens adeptos do minimalismo, da compra como uma experiência e não somente uma aquisição — e imbuídos de grande consciência socioambiental —, o mundo da moda se vê diante de uma imperiosa reinvenção.
Da mesma maneira, os novos modos de vida impostos pela Covid-19 estimulam que ações sejam colocadas em prática. Tudo para que se mantenham vivos tanto o consumo já existente quanto as novas demandas que possam vir a surgir.
A ordem do mundo da moda é “recicle-se” — foi-se a época em que a principal preocupação era apenas lançar mais uma coleção, com mais uma bolsa queridinha da temporada. Agora, as it girls buscam alternativas nos brechós.
Garimpar peças de roupa em brechós parece batido, tendo em vista que eles sempre fizeram parte do consumo das peças de vestuário, remontando à realidade de nossas avós, tias e mães. Ocorre que essa forma de consumo também se modernizou para acompanhar a nova realidade que se apresenta.
A ideia passa pelas mãos de especialistas na criação de looks, que acabam por alterar e atualizar todo o conceito da venda de peças second hand. Assim, os brechós são repaginados e recolocados no mundo digital, sem esquecermos de acrescentar o viés social ao negócio.
Existe, por exemplo, o “projeto ovo”, desenvolvido pela joalheira Ana Khouri e pela estilista e joalheira Helena Sucupira. Trata-se de uma plataforma que ajuda organizações sem fins lucrativos (ONGs) a gerar receita por meio da venda de peças de segunda mão. Elas recebem doações, escolhem as peças mais promissoras e as enviam para as ONGs, juntamente com um login e uma senha das peças postadas no Instagram do projeto, a fim de viabilizar a negociação.
Em âmbito internacional, destaca-se a plataforma digital norte-americana “The Real Real”, que mantém uma parceria com grifes de roupas famosas. Nesta plataforma, uma das grifes oferece um voucher no valor de US$ 100 à pessoa que entregar um produto usado de sua marca à plataforma. Já outra grife inglesa, também integrante da plataforma digital retromencionada, oferta uma experiência com um personal shopper em suas lojas físicas para quem colocar à disposição da “The Real Real” uma peça sua usada.
Estima-se que o mercado de peças reutilizadas tenha faturado o equivalente a vinte e quatro bilhões de dólares em 2018. Em 2023, segundo projeções, deverá atingir a marca de US$ 51 bilhões.
Buscando lucrar com essa forma de consumo, algumas grifes tentam unir a ideia do resale com o e-commerce da própria marca. O “projeto Second Life”, de uma grife de bolsas, implantou a ideia da venda de bolsas de segunda mão. Ele permite que o cliente que a vendeu utilize dentro do próprio site o valor obtido com a sua peça usada.
Outra tendência para a nova realidade de consumo é o aluguel de peças e acessórios. O Brasil é quase um pioneiro no assunto. Só para citar como exemplo, a “Take me” se apresenta às consumidoras não como uma loja tradicional de aluguel de roupas e acessórios, mas como uma curadoria de vestidos para todas as ocasiões.
Certo é que, diante do atual cenário pandêmico e do que se apresentará no futuro, o grande desafio dos varejistas — e, sobretudo, do mercado da moda — será vender a um consumidor cauteloso. O entendimento do comportamento do consumidor pós-pandemia e a reabertura gradual dos postos de venda, aliada ao constante melhoramento do ambiente e-commerce, poderá auxiliar nas próximas ações.