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Como o abismo da inclusão digital afeta o e-commerce

Por: Dinalva Fernandes

Jornalista

Jornalista na E-Commerce Brasil. Graduada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada em Política e Relações Internacionais pela FESPSP. Tem experiência em televisão, internet e mídia impressa.

Anos atrás, parecia fácil descrever o estereótipo do “internauta”: jovem, tatuado, que fala inglês e interessado em tecnologia. Por muito tempo, tudo que estava online, incluindo as vendas, era voltado para esse tipo de usuário. Mas focar nesse perfil até hoje é um erro que precisa ser corrigido.

No Brasil, existem 152 milhões de internautas com mais de 10 anos de idade, o que corresponde a 81% da população. No entanto, o acesso à internet não é igual entre todos. Esse fato chama a atenção para os desafios da inclusão digital em um país de desigualdade social, sobretudo, ao considerar que essas pessoas podem ser consumidores em potencial.

“Apesar de o brasileiro estar comprando mais online, o e-commerce não é tão disseminado para classes C, D e E quanto para A e B. Mas isso deve mudar”, pontua Renato Meirelles, presidente e fundador do Instituto de Pesquisa Locomotiva. O executivo participou do Fórum E-Commerce Brasil – Grand Connection, na terça-feira (14).

Ele ressalta o crescimento da participação de classes de baixa renda no consumo e nas vendas pela internet, impulsionadas pelas dificuldades causadas pela pandemia. “Dois terços dos brasileiros perderam renda durante a pandemia. Mas, entre os conectados, dois terços mantiveram ou aumentaram a renda nesse período. Estamos vendo um modelo de geração de renda em uma camada importante da sociedade brasileira. Isso faz com que essas pessoas ‘realimentem’ o ecossistema do e-commerce. Para isso, antes temos que superar problemas estruturais da sociedade de acesso digital”, avalia.

Barreiras de acesso

Uma das principais barreiras de acesso pode ser notada pela questão geracional: 96% dos jovens entre 16 e 24 anos estão conectados, enquanto apenas metade dos idosos de mais de 60 anos são usuários de internet.

A renda econômica e a localização do indivíduo é outro tópico responsável por mais um “gap digital”. Os mais ricos e moradores de áreas urbanas são mais conectados do que os mais pobres e que vivem em áreas rurais.

A barreira educacional também afeta os usuários, sendo os estudantes de escolas privadas e com nível superior os mais digitalizados.

Em uma perspectiva mais aprofundada, avaliando o universo de conectados, Meirelles aponta limitações que os brasileiros enfrentam em seus cotidianos online. Para apresentar as diferentes formas de exclusão experimentadas pelos usuários, sobretudo das classes C, D e E, o Instituto Locomotiva criou o “Índice de Privação Online”.

“Somente 29% dos usuários ainda fazem parte daquele estereótipo de internauta que pensávamos há alguns anos, que são considerados os ‘plenamente conectados’ e são, em maioria, brancos, escolarizados e das classes A e B”, afirma o fundador do instituto.

No índice, é possível encontrar outros três grupos: os “parcialmente conectados”, que representam 26% dos brasileiros com acesso à internet e fazem parte das classes C e D; os “subconectados”, 25%, das classes D e E; além dos 20% que formam os “desconectados”, composto por pessoas mais velhas, não alfabetizadas, das classes C, D e E.

Desigualdade digital

Meirelles afirma que a renda está totalmente ligada a esses grupos, construindo o que ele chama de “abismo digital”. “Esses brasileiros não conseguem ter uma relação igual com a internet, o que acaba criando um ciclo vicioso na sociedade, porque afeta também o acesso dessas pessoas à escola, trabalho e qualidade ou existência de conexão à internet”.

Essa desigualdade pode ser observada por dois eixos: a infraestrutura e o letramento digital. Com a infraestrutura nacional de Telecom sobrecarregada e a distribuição de sinal desigual entre áreas urbanas e periféricas, a conexão para os mais pobres é drasticamente afetada.

O pouco investimento em equipamentos públicos à disposição da sociedade e as limitações de dados oferecidos pelas operadoras para o acesso à internet domiciliar e individual contribuem para acentuar a lacuna entre as classes sociais. Ou seja, sem acesso, é difícil exigir habilidade dos menos favorecidos para o uso da internet.

Ao compreender o cenário econômico do consumidor, é possível concluir que a defasagem no letramento digital do brasileiro e a infraestrutura precária comprometem negativamente o resultado de vendas online. Contudo, é também uma chance de perceber o quanto o e-commerce poderia crescer se a desigualdade for superada.

“Estamos em um jogo de ‘rouba-monte’ em vez de crescimento e temos o desafio de fazer com que essa situação não se perpetue”, conclui Meirelles, que sugere como ponto de partida a exigência de políticas públicas que garantam o acesso à internet como um direito fundamental do cidadão. “Se não for por valores sociais, que seja por inteligência: o abismo digital atrapalha os lucros”.

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Por Marina Teodoro, em cobertura especial para o Fórum E-Commerce Brasil.