Ser sustentável não é mais uma opção bonita que diferencia uma marca consciente e sim uma obrigação do mercado. É isso que defende Isabela Chusid, CEO e fundadora da Linus, uma marca de lifestyle sustentável que tem se destacado ao integrar práticas ESG (ambiental, social e de governança) em todas as etapas de sua operação.
Em entrevista para o E-Commerce Brasil, a executiva compartilha insights sobre a criação da marca, desafios do setor e a importância do ambiente digital na construção de uma jornada sustentável.
O consumo sustentável deixou de ser uma tendência para se tornar um pilar essencial na estratégia de marcas que desejam permanecer relevantes em um mercado cada vez mais consciente. Nos últimos meses, estudos têm revelado que os consumidores valorizam práticas ambientais responsáveis e estão dispostos a pagar mais por produtos alinhados a esses princípios.
Uma pesquisa da Descarbonize Soluções revelou que 70% dos brasileiros consideram o comprometimento ambiental das marcas um critério importante na decisão de compra. Entre as ações sustentáveis mais valorizadas estão a redução de emissões de gases poluentes, o investimento em energias renováveis e a implementação de políticas de reciclagem.
Além disso, o conceito de consumo sustentável tem ganhado força no Brasil, com 42% dos consumidores dispostos a pagar mais por produtos e serviços de empresas comprometidas com práticas sustentáveis. Essa mudança de comportamento está impulsionando o varejo a adaptar suas ofertas, priorizando produtos ecológicos e transparência nas cadeias de produção.
Nesse cenário, o comércio eletrônico emerge como uma ferramenta poderosa para promover a sustentabilidade, oferecendo flexibilidade e escalabilidade para negócios inovadores. Seja ao abordar a logística reversa, a adaptação de grandes players ao mercado sustentável ou o equilíbrio entre promoções como a Black Friday e práticas éticas, a Linus oferece um exemplo real de como unir propósito, inovação e impacto no varejo.
Confira a entrevista completa:
E-Commerce Brasil: Já passou da hora das marcas assumirem um compromisso ESG, mas muitas ainda patinam na hora de entender e implementar estratégias do tipo. O que precisa mudar dentro da organização para que os produtos sejam de fato sustentáveis?
Isabela Chusid: Um ponto importante na discussão sobre negócios sustentáveis é a visão de que as mudanças vão além do produto. Uma gestão sustentável passa pelos métodos de produção, mas também impacta o funcionamento do escritório, as condições de trabalho da equipe e até decisões criativas. Na Linus, gostamos de dizer que nossa visão de sustentabilidade passa por três esferas: a do produto (como ele é produzido, a matéria-prima escolhida, como é seu ciclo de vida, etc.), a da empresa (como tornar o escritório mais eficiente, como compensar as emissões dos funcionários, como garantir um ambiente confortável de trabalho, etc.) e a da sociedade (qual impacto queremos ter fora da empresa, quais projetos vamos apoiar, quais causas são apoiadas pela equipe, etc.). Sem esse olhar 360, dificilmente uma empresa terá uma boa estratégia ESG.
E-Commerce Brasil: Além da sustentabilidade, quais outros passos acompanham uma operação mais ‘limpa’? Pensando em descarte correto de materiais, cultura da empresa, estrutura, busca por matéria-prima, enfim.
Isabela Chusid: Todas as atividades da empresa precisam se adaptar para se tornarem mais sustentáveis. A cultura interna da empresa é essencial para este processo, já que todo o time precisa estar engajado para contribuir para uma operação mais “limpa”. Para isso, atividades educacionais são imprescindíveis, já que, infelizmente, ainda não temos uma educação de qualidade sobre assuntos de sustentabilidade ambiental e social no país.
Costumamos dizer que a transformação sustentável é uma caminhada sem destino final, então pesquisas e testes para aprimorar processos são importantes em todo momento, já que sempre há espaço para ajustes que permitam um funcionamento mais sustentável para a empresa. Por fim, outro ponto crucial que exige atenção é o ciclo de vida do produto e as alternativas de logística reversa, para garantir que todo o esforço para tornar a produção e a venda dos produtos mais sustentáveis não seja em vão quando o cliente descartá-los.
E-Commerce Brasil: Me conta um pouco sobre como foi a criação da Linus. De onde surgiu a ideia, os pormenores da criação de uma identidade, principais dificuldades etc. Sua relação com o segmento e com a importância de criar algo sustentável também são relevantes para o case.
Isabela Chusid: A Linus surgiu a partir da minha vontade de trabalhar com algo que me trouxesse propósito e fizesse sentido para o meu dia a dia, para o meu estilo de vida. Sustentabilidade sempre foi um dos temas que mais me tocou. Gosto de contar que aos 4 anos, aprendi o que era reciclagem e acabei fazendo com que todo o meu condomínio passasse a reciclar.
Poder trabalhar com algo que me permite casar isso com a forma como gosto de me vestir e ser no dia a dia é realmente incrível. E a identidade da marca nada mais é do que isso: queremos levar sustentabilidade de uma forma leve à rotina das pessoas, levando elas mais longe nessa jornada, um passo de cada vez.
E-Commerce Brasil: Quais recomendações você daria para alguém que está com uma ideia sustentável em mãos e não sabe por onde começar? Qual o papel do ambiente digital nisso tudo?
Isabela Chusid: Uma vez, um empreendedor que admiro muito me disse que “se você não tem vergonha do produto que está lançando, você já está atrasado”. A ideia por trás disso é de que você deve lançar o seu MVP (mínimo produto viável) quando ele ainda não está totalmente “finalizado” – ou, em outras palavras, é aquela máxima “antes feito do que perfeito”. Em termos de sustentabilidade, é a mesma coisa. Busque, genuinamente, as soluções mais sustentáveis possíveis naquele momento e siga com elas. Mas essa busca por opções mais sustentáveis precisa ser contínua. O ambiente digital te permite, entre diversas coisas, começar com estoques pequenos para ir testando, entendendo e melhorando o seu produto. Afinal, você não precisa encher as prateleiras de uma loja física.
E-Commerce Brasil: Pensando no cenário que temos hoje, você vê as marcas adotando posturas mais sustentáveis em um curto prazo? O mercado já está mais adaptado ou ainda é “para inglês ver”?
Isabela Chusid: Marcas mais novas tendem a já nascer com um viés sustentável, pois entendem que há algum tempo esse deixou de ser um diferencial competitivo. Em contraponto, marcas, ou mesmo empresas, com anos de mercado e de maior porte, estão buscando formas de se conectar com iniciativas relacionadas à sustentabilidade para melhorar o seu posicionamento, enquanto enfrentam desafios para, de fato, trazer mais sustentabilidade para a sua cadeia produtiva – sejam esses desafios burocráticos, financeiros ou até de fornecimento. O “para inglês, ver”, nesse contexto também podendo ser chamado de greenwashing, existe. Mas, cada vez mais (mesmo que aos poucos), os clientes estão aprendendo a identificá-lo. Se as pessoas já chegaram no ponto de deixar de comprar objetos por isso é outra coisa, mas consciência elas têm.
E-Commerce Brasil: Como uma marca sustentável, faz sentido entrar em promoções como a Black Friday, que priorizam a queima do estoque e uma produção mais rápida? Se sim, por que?
Isabela Chusid: Este é um ponto que sempre discutimos na Linus. Como uma empresa sem investidores e que faz aportes significativos em pesquisa e desenvolvimento, principalmente para tornar nossos produtos e processos ainda mais sustentáveis, momentos como a Black Friday são importantes para nossa saúde financeira. Nós fazemos questão de explicar estes pontos para nossos consumidores e, do ponto de vista de marketing, tomamos muito cuidado para comunicarmos nossas ações de forma responsável. Neste momento do ano, a ideia é expandir a marca e alcançar novos públicos, mais do que incentivar o consumo desenfreado em quem já faz parte da nossa comunidade.
E-Commerce Brasil: Comente um pouco sobre a internacionalização da Linus, como foi o processo, como foi atrair e conquistar o olhar do exterior.
Isabela Chusid: A internacionalização da Linus aconteceu de forma muito orgânica ao atrairmos pessoas de fora do país que queriam comprar nossos produtos através do nosso site, mas, por serem estrangeiros e morarem fora, não conseguiam finalizar a compra. Junto dessas pessoas, apareceram, também, marcas querendo se tornar nossos revendedores – e foi justamente esse o primeiro passo que demos para o exterior.
O Brasil é um país internacionalmente conhecido como um polo calçadista e já possui tradição quando se trata de sandálias. Um produto que traz, junto dessa tradição, muita brasilidade por meio das cores, uma preocupação socioambiental verdadeira e um posicionamento autêntico chamou rapidamente a atenção de consumidores estrangeiros, levando a eles essa energia única do nosso país.