Será que as empresas sabem como a publicidade online realmente vai impactar os consumidores? Este foi o tema central da palestra da Joanna O’Connell VP, Principal Analyst da Forrester, durante o CX North America, evento da empresa focado em experiência do usuário.
Pois a descoberta da executiva foi que nem todos as propagandas alcançam o que querem. Ao invés de encantar e atrair os consumidores, muitas acabam sendo irritantes e invasivas, fazendo com que o cliente se distancie da marca.
Em um levantamento realizado sobre a Forrester sobre o assunto, 60% dos consumidores norte-americanos alegaram que as propagandas online são assustadoras, irritantes ou que os fazem se sentirem sobrecarregados.
Ela comparou o atual cenário, em que muitas empresas usam os dados dos consumidores para sugerirem publicidade em diversas redes simultaneamente, a um vizinho perseguidor, que quer saber tudo sobre a sua vida. Também fez relação com um primeiro encontro desastroso, em que a pessoa já te conhece antes de vocês se conhecerem de verdade.
“Dessa forma os usuários estão se afastando do que parecer invasivo”, ela explica. Para o mundo da publicidade, isso quer dizer um alerta vermelho: é hora de mudar. Não só pelo desconforto do consumidor, mas também pelas alterações globais com relação ao uso de dados — como é o caso de leis e políticas, como a LGPD (no Brasil) e a GDPR (na Europa).
Apesar disso, a publicidade tem seu mérito: para 40% dos consumidores, os anúncios são uma boa forma de conhecerem novos produtos. Assim, para resgatar o valor da publicidade aos consumidores é preciso buscar um equilíbrio que seja bom aos dois lados.
Walled Gardens
Até agora, as empresas se acostumaram a pensar na personalização através do uso massivo de dados vindos de diversas fontes, mas não precisam mais ser assim. Uma das alternativas sugerida por O’Connell é que as companhias comecem a pensar nos dados a partir do modelo de Walled Garden (jardim com muros, na tradução para o português).
Trata-se de um ecossistema fechado, em que é possível controlar a entrada e o uso de aplicações e informações. Sendo assim, os usuários ficam mais seguros e os dados podem ser melhor aproveitados em nichos pelas empresas.
O uso restrito de dados tem duas principais vantagens para O’Connell: por mais que os dados sejam mais limitados, eles são mais específicos e nichados, de maneira que “as informações são mais férteis”; e “os ambientes se tornam mais apelativos e necessários para as empresas”, que vão querer investir em segurança de dados para alimentar o ecossistema de maneira consistente.
Futuro da propaganda
Para prever o que virá nos próximos anos, a especialista sugere uma análise dos atuais problemas e como solucioná-los:
- Cenário em que os consumidores estão irritados e insatisfeitos com a publicidade;
- O acesso aos dados será cada vez mais limitado;
- Os jardins serão seletivos e há responsabilidades com os dados usados.
Dessa forma, a forma como a publicidade é encarada deve mudar também. A executiva defende estratégias menos “wild west” — ou seja, de exploração do velho oeste, em grande escala — para um perfil mais “gated comunity” (comunidade fechada) de consumidores.
Para tal, a propaganda deve ser:
1) Campanhas nichadas, com menos acesso aos dados, porém melhor uso deles
“Estamos imaginando um mundo em que as companhias percebem que os dados que já tem são essenciais”, explica a VP. Neste momento, é importante para a empresa aprimorar a comunicação para que o usuário dê informações de maneira espontânea. São os chamados first and second party data — informações exclusivas coletadas pela empresa e informações de pesquisas que estão à disposição, respectivamente
2) Novas formas de dados
“Os anunciantes vão ter que procurar por novas formas de dados”, deduz O’Connel, ou seja, os chamados third party data, informações de múltiplas fontes que dão uma ideia de perfis de consumidor em determinados ambientes, posições sociais, demográficas, etc. Ela defende também que “estamos caminhando para um mundo em que os anunciantes vão ter que criar uma relação com o consumidor para conhecê-los de verdade”.
3) Cookies não terão mais espaço
O uso de cookies pouco a pouco está perdendo espaço para políticas de privacidade baseadas em infraestrutura e tecnologia. As campanhas terão que se alinhar à privacidade do consumidor e às novas políticas de proteção de dados para serem realmente efetivas, defende a executiva: “Ou seja, uma maneira de se aproximar do consumidor de maneira que seja respeitosa com os seus dados”.
Equilíbrio entre publicidade e consumidor
“Nós realmente precisamos criar um novo equilíbrio entre a publicidade e consumidor, além de ambiente saudável para o setor, simplesmente por não termos mais escolha”, diz a executiva. Uma das maneiras de trilhar esse novo caminho é com uma aproximação adequada com os usuários.
Para isso, é preciso criar segmentações eficientes dos tipos de público e basear as campanhas no relacionamento. A executiva defende ainda que a publicidade precisa redefinir a sua noção de intimidade com o consumidor e construir uma jornada de compra ao lado dele para criar a personalização. Dessa forma, eles não vão mais se sentir espiados por um vizinho, como o exemplo dado no começo do texto.
Entender a jornada de compra
Empresas que já começam a prospecção de maneira muito íntima “parecem que deram um passo maior do que o necessário” na percepção do consumidor.
Ao mesmo tempo, o “tarde demais” também pode ser prejudicial. O’Connel dá o exemplo de carros que ela costuma consumir. A empresária tem um carro da marca Subaru e realiza as trocas de veículos, revisões e reparos com a empresa há algum tempo, mantendo uma comunicação saudável e amistosa — e-mails, atendimento ao cliente etc.
No entanto, é desconcertante receber da marca anúncios em suas redes sociais de um produto que ela já adquiriu — um carro, no caso, com grande valor agregado.
Dessa forma, ela defende que muitos consumidores podem se sentir “esquecidos” ou “não notados” pelas empresas das quais já são consumidores, pois a publicidade não leva em consideração a jornada de compra que já tiveram juntos.
Além disso, a publicidade mal aproveitada gera desperdício financeira para a marca, pois poderia estar alcançando novos clientes e fortalecendo laços com os que já tem.
“Publicidade é experiência do consumidor”
“A entrega de uma boa experiência não deveria ser apenas uma responsabilidade delegada ao relacionamento com um consumidor que está comprando com você, mas sim uma oportunidade para todas as vezes que você se comunica com ele”, diz O’Connell.
Dessa forma, qualquer ponto de contato com o consumidor é uma oportunidade de cativá-lo e melhorar o processo de compra como um todo. “A publicidade é experiência do consumidor” afirma a VP.
Para que todos os pontos de contato com o consumidor gerem uma boa experiência, O’Connell separou 4 tópicos de atenção. São elementos que devem ser repensados com frequência para acompanhar as jornadas do consumidor e o entendimento dele sobre a marca.
1) Invista em comunicação
Além da publicidade, é preciso estar em contato com o seu consumidor de maneira transparente. Deixe claro que os dados que ele fornece servem para melhorar a experiência dele e que a voz dele é importante para a companhia.
É preciso também que o consumidor entenda a sua publicidade e saiba que ela não é a única forma de contato que a empresa quer manter.
2) Repense o seu sistema de parcerias
É preciso que as companhias tenham em mente que os valores apresentados pelos seus parceiros geram consequências na imagem diante do consumidor. A executiva defende que as companhias busquem parceiros que se aproximem dos consumidores da mesma maneira que a sua empresa faz, ou pelo menos buscando os mesmos resultados.
Como consequência, a executiva explica que eles facilitam a comunicação. Além disso, “são parceiros que colocam em prioridade também a sua experiência”, fazendo com que a sua empresa prospere.
3) Seja criativo
Os consumidores estão cansados de publicidades invasivas ou que interrompam a sua navegação. Atualmente, é possível tornar a publicidade uma parte da experiência do consumidor nas plataformas digitais, seja de maneira visual, interativa ou pela oferta de conteúdo.
Ela recomenda também que a empresa permita que o usuário escolha a forma como quer receber a publicidade, pois isso o deixará mais confortável.
4) Pense em estratégias à longo prazo
É preciso sempre se perguntar “como a sua propaganda deve fazer o meu consumidor se sentir?”. A partir disso, avaliar os dados e a satisfação do consumidor com a publicidade constantemente. Além disso, O’Connel acredita que a publicidade precisa de fato “funcionar e entregar valor”, ou seja, fazer o consumidor consumir e gostar da marca.
Leia também: Como gerar experiência personalizada sem o uso de dados?
Por Júlia Rondinelli, da redação E-Commerce Brasil.