Relacionamento com o consumidor se torna essencial para aumento de vendas no e-commerce, mas mesmo assim muitos lojistas ainda têm dúvidas sobre implementação de um CRM
No começo de junho, o E-Commerce Brasil promoveu um evento voltado totalmente para o público de Martech. Durante as palestras, enquetes eram direcionadas ao público com o objetivo de conhecer melhor quem movimenta as operações de marketing nas lojas virtuais brasileiras, e um dos resultados chamou muita atenção: 46% dos presentes declararam não possuir um sistema de CRM para suas estratégias.
A sigla CRM quer dizer customer relationship management, que em português pode ser traduzida para “gerenciamento do relacionamento com o cliente”. Isso porque é a estratégia que cuida da comunicação da marca com o consumidor, assim como os meios pelos quais essa comunicação chega até ele e todas as estratégias que envolvem a divulgação.
Esse gerenciamento está diretamente ligado com a evolução da tecnologia voltada para o consumo. Com a digitalização dos processos de trabalho, cadeias produtivas e malhas logísticas globalmente conectadas via Internet e novas tecnologias de comunicação, redes sociais e algoritmos de todo tipo, multiplicam-se os fatores que nos últimos anos vêm capturando a atenção e impactando o consumidor em todas suas interações, gerando necessidades que a própria tecnologia passa a suprir ou proporcionar.
É importante salientar, porém, que planos de CRM não são sinônimos de uso apenas de tecnologia. Um time engajado em criar maneiras de melhor relacionamento com o cliente, por exemplo, já se enquadra nessas estratégias.
Fausto Reichert, que possui mais de 20 anos em atuação em marketing e vendas e hoje é Chief Strategy Officer do PipeRun, explica como os avanços tecnológicos sempre foram direcionados no aumento de consumo no online. “Os avanços tecnológicos são os grandes responsáveis pelo aumento do consumo de formas digitais e, dessa forma, estimulam o consumo via e-commerce, que teve ainda fatores diretos, como uso massivo de celulares, ampliação de processamentos de dados e imagens e acessos à Internet hoje popularizados”.
O CRM já é um antigo conhecido do varejo. Hoje, no entanto, está cada vez mais acessível e necessário para a sobrevivência dos negócios digitais. Essa é a opinião de Danilo Nascimento, sócio diretor da Propz, startup que utiliza inteligência artificial e big data para oferecer soluções de CRM.
Ele defende que a estratégia precisa ser vista pelos lojistas como um item de extrema necessidade, e não só um luxo ou diferencial. “De uma forma resumida, o CRM hoje deixa de ser um diferencial competitivo e passa a ser um elemento de sobrevivência”, argumenta Nascimento.
Para Reichert, o CRM se tornou uma consequência positiva da revolução do varejo através do digital. O especialista acredita que esse tipo de tecnologia se tornou um maestro para a gestão de estratégias.”O CRM passou de uma ferramenta transacional de armazenamento para um orquestrador de estratégias digitais avançadas, resultando dele a perspectiva e a capacidade de tratamento dos consumidores como são, únicos”.
A busca incansável por mais clientes
Existem duas formas principais de conquistar clientes no comércio eletrônico: investimento em mídia programática (que se dá principalmente por anúncios nas redes sociais e no Google), que conquista na maior parte das vezes consumidores novos, e ativação da base de clientes antigos, que pode ser feita através de estratégias de CRM que se comuniquem ativamente com pessoas que já compraram da marca.
“Eu vejo o CRM como uma das poucas ferramentas efetivas que o varejo tem disponível (pela ótica de engajamento do consumidor) para que, se bem executado, ele consiga realmente engajar clientes e alavancar vendas com uma margem minimamente sustentável”, defende Nascimento.
Para Nascimento, as duas estratégias são importantes, mas é preciso ter um equilíbrio para que o lojista não gaste demais com consumidores novos, uma vez que é mais barato e lucrativo fazer consumidores antigos comprarem novamente.
Ele completa que “o lojista sempre terá uma necessidade de aquisição de clientes, mas o canal majoritário de tráfego, para que ele tenha equilíbrio econômico, tem que ser ativar a própria base”.
Em torno de 70% do tráfego do e-commerce precisam vir de uma estratégia de ativação da base. E a explicação dada por Nascimento é simples: “Porque é onde ele não paga CPA, onde o canal é dele, onde ele não precisa pagar mídia programática e onde o cliente gasta mais”.
Muito mais do que um disparo de e-mail marketing
No evento sobre Martech, outra resposta de enquete chamou a atenção. Ao serem indagadas sobre o porquê de não fazerem uso de um CRM, 37% das pessoas afirmaram que já possuíam uma equipe dedicada a responder e-mails e fazer campanhas.
Uma pesquisa realizada pela Adtail em parceria com o E-Commerce Brasil buscou criar um panorama sobre o cenário de CRM no Brasil e descobriu que 55% dos lojistas de e-commerce fazem integração dos dados com as lojas físicas. Com relação aos principais investimentos, 74% responderam que investem em e-mails responsivos.
Nascimento explica que existe uma ideia equivocada sobre o que é CRM para muitos profissionais de comércio eletrônico e garante que é “muito mais do que disparar e-mails marketing”. “No e-commerce atual, o CRM tem que assumir o papel de ser o maior gerador de tráfego de um e-commerce. Se ele assumir esse papel, não tenho dúvida de que o varejista caminhe não só para vender mais, mas também terá um e-commerce com mais rentabilidade”.
Gustavo Perina, CEO da Webstore e que atua há mais de 20 anos com e-commerce, alerta para a visão errada que muitos lojistas têm do CRM. “Ainda há muito a ser explorado quando o assunto é CRM para e-commerce. O lojista brasileiro está começando a se acostumar com a tecnologia cada vez mais presente em suas vidas, mas, primeiramente, é importante sabermos que o CRM não é apenas um sistema de acompanhamento de vendas do time comercial, e sim uma ferramenta de análise e relacionamento com a base de prospects e clientes”.
Hoje, um CRM eficiente apresenta pelo menos quatro funcionalidades consideradas por especialistas imprescindíveis para uma estratégia de venda no e-commerce: capacidade de personalizar o consumo, mensuração dinâmica, precificação dinâmica e capacidade de ampliar o engajamento do consumidor em múltiplos canais.
É através da personalização do consumo que o lojista consegue entender para quem deve vender e para quem já está vendendo. “Para isso, é preciso ter tecnologias de decisão autônoma, ou seja, machine learning, que vai pensar sozinho baseado nas ofertas de comportamento do seu consumidor e eleger as melhores para cada um, de forma individual e personalizada. Isso obviamente suporta um conceito de inteligência artificial”, explica Danilo Nascimento.
A mensuração dinâmica permite a automação dos resultados efetivos das campanhas. De forma literal, é o que permite que a equipe de marketing saiba o que está dando certo e o que está dando errado nas estratégias de mídia.
Ao permitir uma precificação dinâmica, o CRM acaba fazendo com que o lojista ganhe tempo nas definições de preços. “Além da capacidade de definir uma oferta individual, você precisa ter a capacidade de definir esses preços com um suporte científico dado pelo aprendizado. Ou seja: personalizo, aprendo e reflito na operação de forma imediata”, esclarece Nascimento.
Já na ampliação do engajamento do cliente em múltiplos canais, a estratégia consegue diminuir a exaustão de acompanhamento da convergência de dois canais distintos: Google e redes sociais.
Bom atendimento em todos os lugares
Com o e-commerce mais fortalecido depois da pandemia da Covid-19 e a expansão dos aplicativos, a exigência do consumidor mudou. Se a jornada omnichannel já caminhava em passos largos, ficou ainda mais evidente desde o ano passado – daí a necessidade de um atendimento melhor e de conhecimento do consumidor em todos os canais.
“O bom atendimento de hoje é estar onde seu cliente está, é a multicanalidade, é o omnichannel, é a presença digital, é a disponibilidade instantânea, é a manutenção da presença da marca no cotidiano dos consumidores. Entregar o produto, no preço adequado, no prazo pactuado, com qualidade, segurança e conveniência máxima são ‘commodities’ ou, num bom português, é o mínimo necessário para um bom atendimento ao cliente”, explica Reichert.
Entender o universo omnichannel é entender para onde direcionar as comunicações. Se as estratégias de CRM devem conter inteligência de todos os dados, isso precisa, cada vez mais, englobar todos os canais. Mais que atender bem, virou mantra atender bem em todos os lugares.
Por Gustavo Freitas e Júlia Rondinelli, da Redação E-Commerce Brasil
*Este texto foi retirado da Edição 64 da Revista E-Commerce Brasil, publicada em agosto de 2021