Mundialmente, mais especialmente nos Estados Unidos, estamos vendo o fenômeno de criadores de conteúdo fazendo sucesso com marcas que levam suas assinaturas. Contudo, tirando alguns poucos casos, não conseguimos enxergar no Brasil a repetição do mesmo formato. É muito difícil apontar quais os motivos específicos de por que isso acontece, contudo, conseguimos levantar algumas inferências para esse fenômeno.
Acredito que o primeiro motivo seja o engajamento dos próprios criadores. A renda da maioria deles não está vinculada à venda de seus produtos, tendo a marca um papel secundário na composição de renda dos influenciadores. Mesmo aqueles que não têm uma vida artística paralela acabam ganhando muito mais dinheiro com pacotes de conteúdo produzido para outras marcas, exigindo menos esforço e menos risco à imagem.
Exemplos práticos no Brasil
Exemplo de quanto essa dedicação é valiosa, Virgínia Fonseca conseguiu construir uma marca de R$ 220 milhões de faturamento por ano se dedicando quase exclusivamente a contar sua vida e interação com sua marca We Pink.
Gusttavo Lima, mesmo sem ter o mesmo sucesso, vem construindo duas marcas (Vermelhão e GL), uma de bebida e outra de cosméticos com relativo sucesso. Porém, enquanto a marca de bebida precisa de pouquíssimo esforço para decolar e vincular sua identidade ao artista, a marca GL anda caminhos árduos para conseguir emplacar seus produtos. Isso se deve a um segundo fator determinante de sucesso que é a conexão entre marca e criador. O Vermelhão é a bebida de fato do Gusttavo Lima, faz parte do seu dia a dia, está organicamente em suas lives e posts. Enquanto que os produtos GL (muito bem produzidos pelo grupo Adventures) precisam de muito mais investimentos promocionais e em público topo de funil para atrair possíveis compradores.
Canais de distribuição e qualidade dos produtos
Outro fator são os canais de distribuição. Essas marcas se lançam primordialmente como DNVBs e, sendo canais online puros, enfrentam muitas dificuldades para gerar atração para seus sites. Pensando que ainda temos por volta de 85% das vendas no varejo físico, a tangência com esses produtos se torna bastante difícil. Aqui, podemos cruzar com outro fator, que é o tipo de produto lançado. A maioria desses lançamentos se concentraram no mercado de saúde, beleza e bem-estar voltados para classe B e C. Olhando para esse público, temos players gigantescos como Natura/Avon, O Boticário, Jequiti, entre outros. Assim, podemos atribuir a eles um fenômeno que se atribuía à marca OMO da Unilever durante anos, no qual os usuários não teriam renda para se aventurar com uma marca desconhecida, permanecendo assim fiéis a marcas já conhecidas anteriormente.
Outro ponto relevante é a dúvida sobre a qualidade dos produtos. Podemos acompanhar em diversos fóruns o questionamento sobre a performance, a qualidade de embalagem e dos produtos, afirmando que transmitem marcas de muito baixo valor. O que nem sempre é verdade. Muitos desses produtos são feitos com os mesmos fornecedores ou com fornecedores até melhores do que os de grandes marcas. Porém, a rentabilidade nesses casos pode ser um desafio adicional para a sobrevivência dessas empresas, pois não conseguem escalas competitivas.
Desconexão entre marcas e celebridades
Por fim, vejo aqui uma ambição desconexa entre as marcas e as celebridades. Enquanto os criadores de conteúdo querem ser reconhecidos como um público diferenciado, suas marcas são destinadas a um público que não tem essa mesma identidade. Podemos aparentemente ver um desses casos com o lançamento da marca LOOD de Ludmilla. Enquanto sua imagem conversa com comunidades de baixa renda e tem forte apelo social, seu perfume foi lançado com uma superprodução e com enredo destinado à elite carioca. Se entrarmos no site da marca hoje, veremos descontos muito acima do que é praticado pelo segmento.
Assim, acredito que para, uma marca de criador de conteúdo dar certo no Brasil, alguns pontos importantes devem ser respeitados:
1. Desejo empreendedor genuíno da celebridade.
2. Produto que tenha TOTAL tangência com a história de vida dona da marca.
3. Produtos de extrema qualidade e custo competitivo.
4. Uso orgânico do produto pela celebridade, ou seja, mais do que fazer propaganda, deve incorporar o produto ao seu dia a dia.
5. Engajamento da celebridade com o produto em suas redes sociais, reafirmando a recomendação da marca.
6. Pensar em segmentos não saturados, que possam crescer de forma horizontal.
7. Posicionar a marca com o público que realmente quer atingir.
Deixo aqui uma lembrança inesquecível de Rihanna parando o Super Bowl para aplicar um produto de sua marca. Precisou de menos de cinco segundos para retocar sua maquiagem e, sem dizer uma palavra, causar uma explosão na busca do Google por sua marca Fenty Beauty.