Os consumidores do e-commerce demandam dos lojistas ininterruptos investimentos em desenvolvimento dos seus sites, seja estruturalmente (maior capacidade de processamento, defesa contra quedas, estabilidade etc.) ou esteticamente.
A palavra de ordem na Internet é sempre proporcionar aos usuários uma “melhor experiência”, o que não tem muita relação com questões relativas ao Direito, como as referentes à clareza e precisão das informações da oferta, as formas de pagamento, as características dos produtos etc.
A “melhor experiência” frequentemente foca no visual. São sites e aplicativos cada vez mais bonitos, mas rápidos e funcionais. É a eliminação de burocracia ou das complicações. Repensa-se dos elementos mais simples até os mais sofisticados para proporcionar ao cliente maior satisfação.
Dia desses, durante o processo de compra em um aplicativo, me foi pedida a autorização para fotografar meu cartão de crédito, na tentativa de poupar-me o incômodo de digitar os números (não quis nem pensar nas implicações jurídicas de tal fato, que podem ser enormes). Compra consumada, dinheiro no caixa e empresa focando nas próximas vendas.
Muitos lojistas realmente pensam no seu negócio como se isso fosse a única atividade realmente importante (e de fato é essencial), mas não se atentam para o fato de que parte de seu lucro pode estar indo pelo ralo do Serviço de Atendimento ao Consumidor – SAC. Cada lojista, logicamente, dá o nome que quiser, mas o serviço é um só: atendimento do consumidor antes, durante e depois de realizada a compra.
Os lojistas, quando precisam resolver problemas ligados às suas pessoas físicas, como todo consumidor, devem reclamar do atendimento da maioria dos call centers, dos atendentes despreparados, incompetentes (no sentido técnico, não pejorativo) e sem autonomia para resolver questões simples.
Todavia, os mesmos lojistas esquecem que há diversas pessoas atendendo aqueles clientes que careceram de tanto trabalho para ingressar em suas carteiras. O principal ativo da empresa (os clientes), muitas vezes, acaba renegado a serviços terceirizados de péssima qualidade. Daí a pergunta: e o SAC, como vai?
É certo que uma pequena parcela dos clientes recorre ao SAC para obter informações ou resolver problemas, já que uma das grandes vantagens do comércio eletrônico é a ausência de contato pessoal com quem quer que seja (exceto, óbvio, o entregador).
No entanto, o prejuízo causado pelo mau atendimento frequentemente não se restringirá ao desfazimento da compra (o que já seria ruim, mas suportável), mas poderá envolver indenização por dano moral nos casos extremados e consumir o lucro de uma série de outras vendas.
O que dizer, por exemplo, daquele cliente de uma grande operadora telefônica que recebeu sua fatura com o nome trocado para “Otário Chorão”, ou da consumidora que foi insultada em uma rede social pelo atendente de uma loja virtual?
Em quanto será fixada sua indenização por danos morais, ou qual foi o prejuízo mensurado à imagem da empresa? Todavia, os casos do “Otário Chorão” e da consumidora insultada, apesar de graves, são raros e fáceis de serem detectados e tratados. O que foge pouco da normalidade é o que passa longe dos radares, e eventuais erros podem ser camuflados ou passarem despercebidos.
Por outro lado, a abrangência da atuação do SAC vem aumentando com os multicanais de atendimento, tais como redes sociais, comunicadores instantâneos, sites especializados, chat, além do tradicional telefone. Nas redes sociais e nos sites especializados em reclamações, a competência ou incompetência (agora no sentido pejorativo) se tornam públicas e podem expor a empresa perante o mercado, clientes e futuros clientes.
Do ponto de vista jurídico, é preciso apontar que quando o atendente do SAC fala com um cliente ela está representando a empresa. Segundo o artigo 932, inciso II, do Código Civil, é responsável pela reparação civil o empregador por atos praticados por seus contratados, o que inclui os serviços terceirizados.
Contudo, não é muito difícil detectar problemas causados pelo SAC. Um estudo aprofundado das demandas judiciais que envolveram a empresa nos últimos meses é capaz de fornecer um retrato geral das deficiências.
Via de regra, as ações judiciais não se iniciam sem algumas reclamações realizadas junto ao SAC. Na maioria dos casos, apenas quando o consumidor sente que não adianta mais falar com o SAC é que ele opta pela via judicial. Pois bem, com o referido estudo, é possível fazer um levantamento de cada um dos casos e reunir as informações relativas a eles. A maioria das ligações mais tensas é gravada, e elas poderão revelar o que de fato está errado.
Outra forma de proteção são os chamados SLA (Service Level Agreement), ou acordos de nível de serviço, geralmente formalizados como anexos em contratos comerciais, por meio dos quais é possível estabelecer o nível de qualidade pretendido pelo lojista e, se o prestador de serviço não alcançar tal nível, arcará com um tipo de penalidade, como desconto no preço dos seus serviços ou retenção de valores.
Tanto para SAC interno quanto terceirizado é importante prever rotinas muito bem definidas, com informações precisas e claras ao consumidor. A espontaneidade do atendente do SAC quando o assunto é técnico pode gerar equívocos ou dar falsas impressões ao cliente, criando expectativas que o lojista não poderá suprir. A supervisão jurídica dessas rotinas é essencial para a criação de scripts de atendimento que observem o Código de Defesa do Consumidor e a legislação correlata.
A máxima “é mais fácil ficar de fora do que sair” se aplica às avessas ao comércio em geral, incluindo o eletrônico: o SAC pode ser uma porta sempre aberta para a debandada de consumidores e a queda nos lucros, se não tratado com a atenção que lhe é devida.