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Olhar tropical: NielsenIQ aponta perfil de consumo "nobre" de classes mais baixas na América Latina

Por: Lucas Kina

Jornalista e repórter do E-Commerce Brasil

Fatores como a taxa de inflação, salário e poder de compra ainda definem grande parte do comportamento dos consumidores em relação a escolha de produtos. Mesmo assim, na América Latina, uma análise da NielsenIQ (NIQ) mostrou que classes mais baixas (Nível Socio Econômico – NSE – baixo), como DE, optam por itens chamados high tier, ou seja, marcas mais caras. Por isso, amercado já começou a entender a importância deste cliente que, no geral, compromete 14% dos gastos com itens “do alto da prateleira”. Essas e outras informações estão no “Tropicalizando para crescer: Ativando o potencial da base da pirâmide na América Latina”.

De acordo com Gabriel Lescher Fagundes, diretor de Insights para a Indústria na NielsenIQ, o contraste no perfil de consumo ainda é grande. Mesmo com a importância das classes DE com produtos premium, ainda existe negligência no acesso às categorias básicas, como limpeza doméstica, papel higiênico, escova dental e outros segmentos.

O problema da América Latina, portanto, como é há anos, está na distribuição de renda. Atualmente, segundo dados da NIQ, o crescimento projetado para o PIB na região supera o da Europa e só não fica a frente da Ásia, por exemplo. A discrepância no nível socio econômico é ponto em comum e o que mais atrapalha os países da região.

Contudo, em uma realidade contraintuitiva e fora da lógica que essa realidade nos remete, o estudo reforça sua premissa: as classes de NSE baixo consomem produtos mais caros e as marcas estão percebendo isso.

A pesquisa, que analisou Brasil, México, Colômbia e Chile, mostrou que o grupo DE corresponde a US$ 358 bilhões em renda total nestes países. A participação destes no consumo de bens de consumo rápido (FMCG) na América Latina chega a 25%.

“A ‘base da pirâmide’ chama a atenção de marcas pelo potencial de consumo que possuem. Mesmo com certa inacessibilidade à certas categorias, sendo isso uma implicação social, vemos um padrão de comportamento. Na prática, as classes mais baixas equilibram os gastos com produtos mais caros em categorias que julgam necessárias com itens ‘substitutos’, sendo rótulos mais baratos. Isso balanceia a equação e torna a compra de high tiers mais possível”, explicou Fagundes.

Como se distribui o gasto das classes DE (Fonte: NielsenIQ – Estudo “Tropicalizando para crescer”)

No que diz respeito a democratização de categorias, o levantamento indica que quanto menos essencial, mais longo é o processo para tal. Enquanto itens indulgentes como Snacks (chocolates, salgadinhos, sorvete), lavanderia (amaciante) e Maquiagem são vistos como possíveis, outros como Saudáveis (Iogurtes, Proteína animal) e Alto desembolso (Alcoólicos, Queijos, Café da manhã) são considerados menos relevantes na escolha da classe de NSE baixo.

Na equação do que vai ou não para a dispensa, o consumidor com renda mais baixa considera marcas low tier, ou seja, de prateleira mais baixa e preços menores. Tudo isso para, no final, poder comprar pequenas indulgências (chocolates) e itens de “Primeiro preço”, como um sabonete de valor mais alto.

E-commerce

O comércio eletrônico já entrou para a realidade de consumo do latino americano, principalmente no Brasil. No entanto, de acordo com a NIQ, as classes mais baixas ainda sofrem para acessá-lo, causando um desenvolvimento desigual no alcance de usuários.

Já utilizada desde compras específicas até itens do dia-a-dia e de consumo rápido, o e-commerce brasileiro ainda conta com 10,7% de lacuna na penetração em 2024. A frequência de compra também, até o momento, caiu para 1.7.

Recorte de penetração e gap do e-commerce no Brasil, incluindo as classes mais baixas (Fonte: NielsenIQ – Estudo “Tropicalizando para crescer”)

De forma mais drástica, um ponto alto citado pela pesquisa é que o acesso a internet ainda é uma barreira grande para o desenvolvimento do e-commerce no país.

Dos consumidores das classes DE, 19,2% dos lares com renda mais baixa estão sem acesso a internet. Já para o brasileiro médio, o mesmo índice fica em 10,8%.

Outro ponto envolvendo o e-commerce e apontado no estudo da NielsenIQ é a mescla entre canais. Para o consumidor médio, é normal frequentar cerca de 8,4 canais de compra, enquanto o de NSE baixo chega a 7,5.

Resumo entre os países

De maneira geral, a NIQ também trouxe um apanhado do cenário envolvendo consumidores de NSE baixo em todos os países do estudo “Tropicalizar para crescer”. Veja:

Brasil

Renda total das classes baixas: A participação do Brasil no total de lares de NSE baixo é significativa, com uma concentração populacional na região Sudeste e Nordeste, com 67% dos lares de NSE baixo localizados em regiões metropolitanas.

Penetração e frequência: A penetração de categorias de consumo básico, como café e leite UHT, é forte, mas existe uma diferença relevante em categorias de higiene, como escova de dente, com um gap de-37 pontos percentuais em relação ao painel geral.

México

Gap de penetração no autosserviço: O México apresenta um gap considerável na penetração de autosserviço para lares de NSE baixo, que retraiu mais do que a média geral em 2023. No entanto, existe uma leve recuperação de frequência com o aumento da capilaridade de canais de venda.

Produtos infantis: No México, a cesta de produtos infantis tem uma alta participação entre lares de NSE baixo, com 41% de importância para esse mercado, sendo o único país onde o gasto médio por lar de NSE baixo supera as demais classes.

Colômbia

Produtos de limpeza e higiene: O consumo na Colômbia é elevado em relação a produtos de limpeza e higiene entre os lares de NSE baixo. A preferência é por produtos que ofereçam benefícios adicionais, como limpeza antibacteriana. Itens como desodorantes e sabão para roupas apresentam uma super-alocação em relação ao total de lares no painel geral.

Gap de penetração no autosserviço: A Colômbia também enfrenta desafios em penetração de autosserviço para lares de NSE baixo, embora o gap tenha diminuído em relação aos anos anteriores, com uma leve recuperação.

Chile

Forte preferência por marcas locais: O Chile apresenta uma tendência de super-alocação de marcas locais em categorias específicas, como alimentos e produtos de limpeza. Produtos como aromatizadores de ambiente e limpadores perfumados apresentam um índice de preço elevado, mas com uma penetração significativa entre lares de NSE baixo.

Capilaridade de canais: Os lares de NSE baixo no Chile são altamente concentrados nas regiões metropolitanas, com 72% dos lares localizados em áreas urbanas, o que facilita a distribuição por meio de canais tradicionais.